Laboratório investiga problemas ambientais com técnicas nucleares inovadoras

Crédito da fotografia: 
Arquivo do LARA
O Laboratório de Radioecologia e Alterações Ambientais (LARA) da UFF possui apoio internacional e equipamentos exclusivos da universidade na América Latina

Parceria. Infraestrutura. Capacitação. Esses são os pilares do investimento da Agência Internacional de Energia Atômica (AIEA) no Laboratório de Radioecologia e Alterações Ambientais (LARA) da Universidade Federal Fluminense (UFF). Com a finalidade de promover o desenvolvimento científico, tanto na universidade quanto no âmbito internacional, o laboratório investiga os problemas ambientais e compartilha conhecimento com países latino-americanos.      

O LARA, localizado no Instituto de Física da UFF, existe há 24 anos. Nele, os pesquisadores estudam os problemas ambientais por meio de técnicas nucleares, sendo possível realizar a datação e investigar a evolução pré-histórica, evolução geológica, mudanças climáticas e complicações de estressores ambientais por atividades humanas. Em relação aos estressores, eles podem ser derramamento de óleo, microplásticos, esgoto, poluição química, orgânica, inorgânica, por material radioativo e a proliferação de algas ou microalgas nocivas em ambientes costeiros e marinhos.

O LARA possui técnicas melhores ou inovadoras quando comparadas às técnicas convencionais de análise de problemas ambientais. Através do laboratório, o país obteve destaque como aquele que conseguiu responder às questões da Agência Internacional de Energia Atômica (AIEA). O docente Roberto Meigikos, coordenador do LARA, ressalta a importância do investimento da Agência Internacional de Energia Atômica (AIEA) no laboratório: “Eu comecei a utilizar essas técnicas em torno de 2000. Posteriormente, fui apresentado à agência, que começou a investir em grupos que utilizam técnicas nucleares para compreender os efeitos ambientais. Como as técnicas são caras, eles nos apoiaram para obtê-las. Nós recebemos capacitação, equipamentos e distribuímos conhecimento para outros países da América Latina.”

A Agência Internacional de Energia Atômica (AIEA) firmou parceria com o LARA em 2011 para transformá-lo em um centro de pesquisa, com a finalidade de fornecer suporte para países latino-americanos sem infraestrutura laboratorial. Através da doação de projetos internacionais, o laboratório recebeu equipamentos de maior porte e melhorou sua infraestrutura. Até o momento, cerca de 5 milhões de euros da agência internacional foram investidos no LARA, que conta com aparelhos que somente a UFF possui na América Latina. O laboratório ainda ajuda países como Bolívia, Peru, Venezuela e outros.  

Em relação aos equipamentos, o LARA possui 4 cromatógrafos. Dois, que estão apresentados abaixo, permitem a análise do ácido graxo que está na matéria orgânica, como também observam as relações isotópicas. Eles auxiliam na compreensão da consequência para os processos fisiológicos ou biológicos, ou seja, os efeitos do microplástico para os seres marinhos que os consomem. “Os equipamentos funcionam como se pudéssemos ter um código de barras do que está acontecendo com determinado animal. Assim, temos informações sobre a saúde dele. Isso é muito superior às outras técnicas, pois descreve sobre o comportamento e as mudanças dos processos biológicos”, comenta Roberto Meigikos.


Imagem: Cromatógrafo / Créditos: Arquivo do LARA

Imagem: Cromatógrafo / Créditos: Arquivo do LARA

De acordo com Meigikos, a Petrobrás possui equipamentos iguais a estes. No entanto, eles são usados com outro objetivo, ou seja, somente em relação ao petróleo. Na América Latina, somente o LARA é capaz de preparar amostras e fazer análises com a finalidade ambiental. Para esses aparelhos, as amostras necessitam de um preparo especial e envolvem duas questões: desenvolver tecnologia e expertise em preparar pessoas. Hoje, são poucos os laboratórios no mundo que realizam essas técnicas. “No momento, há três pós-doutorados na UFF, que são pouquíssimos na América Latina, que possuem a capacitação para fazer isso. Investimos muito dinheiro para conseguir treiná-los porque são treinamentos feitos na Alemanha, Inglaterra, Nova Zelândia e nos Estados Unidos”, revela Meigikos.

Imagem: Equipamento com um conjunto de lentes especiais que permite enxergar o microplástico em até cinco microns. Está na fronteira do estudo entre micro e nano plásticos. Nessa configuração, o aparelho é o único da América Latina com esse acessório / Créditos: Arquivo do LARA

Além da estrutura laboratorial, também há as bibliotecas e os projetos internacionais que o LARA participa. Agora, a missão é produzir material de referência e protocolo universal para guiar as análises. “Estamos envolvidos em projetos na Alemanha, na Inglaterra e na China. Trabalhamos juntos para desenvolver essas questões e, ao mesmo tempo, recebemos capacitação e desenvolvemos tecnologia. Depois, vamos espalhar esse conhecimento tanto para outros países quanto para laboratórios do Brasil”, destaca Meigikos


Imagem: Equipamento que, junto com o de cima, permite identificar qual o material que formou o plástico. Desse modo, identifica a fonte / Créditos: Arquivo do LARA 

Os demais aparelhos identificam materiais radioativos. O que está representado abaixo permite, inclusive, datar com chumbo 210 o tempo que o microplástico está no meio ambiente. Afinal, depois da década de 50, ocorreu um crescimento em larga escala da utilização de plásticos. Os microplásticos que chegam aos ambientes costeiros e marinhos são confundidos com alimentos e acabam sendo consumidos pelos peixes. Por meio dos equipamentos, o LARA consegue observar qual tipo de plástico o peixe prefere consumir quando confunde o resíduo com alimento.


Créditos: Arquivo do LARA

Portanto, com todos esses equipamentos é possível identificar a origem, a fonte, o que aconteceu, qual o efeito no conjunto de seres vivos da região e dentro do organismo. Geralmente, cada laboratório possui esses aparelhos separadamente. “Um laboratório que, sozinho, possui todas essas técnicas não é comum. No LARA nós temos todos esses aparelhos juntos. Pegamos uma amostra e realizamos diversos estudos em cima dela. Por isso, precisamos de pessoas especializadas para operar todos os aparelhos ao mesmo tempo. Todas essas questões são mais difíceis de se possuir dentro de um laboratório só”, ressalta Meigikos.

Na segunda semana de agosto, o LARA promoveu um curso de treinamento para 17 países da América e Caribe na UFF. O curso ofereceu capacitação em amostragem e análise para físicos, químicos, biólogos, oceanógrafos e pessoas que trabalham com microplásticos em ambientes costeiro e marinho. Na primeira semana, os profissionais foram capacitados em amostragem, com treinamentos realizados em areia de praia e na Baía de Guanabara, com o auxílio do navio da UFF. Na semana seguinte, eles utilizaram o LARA para analisar as amostras coletadas, a fim de identificar o polímero e a fonte dos microplásticos. Desse modo, os profissionais foram capacitados e levaram a expertise para seus países. 

Finalmente, Roberto Meigikos comenta sobre a necessidade de formar novas gerações de pesquisadores: “É necessário um longo tempo para capacitar as pessoas. Por isso, o que nós mais queremos hoje, dentro da universidade, é que os alunos que passaram por uma pandemia, que conseguiram se formar e os que estão ingressando sigam no caminho da pesquisa”.

 

Roberto Meigikos é bacharel em Física pela Universidade de São Paulo (1984), mestrado em Física pela Universidade de São Paulo (1987) e doutorado em Física pela Universidade de São Paulo (1992). Realizou estágio no National Institute of Water & Atmospheric Research (NIWA, 2013), Nova Zelândia, na área de meio ambiente: Efeitos de Mudanças Climáticas e Degradação do Solo. Foi pesquisador visitante por diversas ocasiões no Lab. Tandar e na UNSL (ambos na Argentina), UdelaR (Uruguai), ANU (Austrália) e CIEMAT (Espanha). Atualmente é Professor Associado do Instituto de Física da Universidade Federal Fluminense. É Cientista do Nosso Estado - FAPERJ. Possui experiência em Física Nuclear Experimental, através de estudos em reações nucleares induzidas por íons pesados e física nuclear aplicada a ciências ambientais e da vida. Desde 1999, é coordenador do Laboratório de Radioecologia e Alterações Ambientais (LARA) e líder do Grupo de Pesquisa do CNPq ‘Física Nuclear Aplicada a Estudos Ambientais’.

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