Projeto da UFF é o primeiro a detectar a presença da bactéria da leptospirose em golfinhos e lobos marinhos no Brasil

Crédito da fotografia: 
Felipe Torres
Pesquisa investiga mamíferos como baleias, botos, golfinhos e lobos marinhos.

A leptospirose é uma doença bacteriana sistêmica, causada pela presença Leptospira sp, que afeta tanto animais domésticos e de vida livre, quanto seres humanos. De acordo com dados do Ministério da Saúde, em 2022, foram mais de 3 mil casos de leptospirose em todo o país, um crescimento de aproximadamente 70% se comparado ao ano anterior. Embora exista uma extensa pesquisa sobre essa zoonose em animais terrestres e humanos, há poucas informações disponíveis sobre a leptospirose em animais marinhos

Diante desse cenário, o professor Walter Lilenbaum, o doutorando Felipe Torres e a pós-doutoranda Maria Isabel Nogueira Di Azevedo, da Universidade Federal Fluminense (UFF), conduziram um estudo com o objetivo de investigar a ocorrência da infecção em mamíferos marinhos, contribuindo para uma melhor compreensão e avaliação do impacto em todas as espécies. Os pesquisadores foram pioneiros na condução de uma pesquisa exclusiva entre a Leptospira e os mamíferos marinhos no Brasil, sendo os primeiros a identificar a presença da leptospira patogênica nesse tipo de animal.  Os estudos foram iniciados em 2020, com foco na busca pela infecção da leptospira em cetáceos, que são mamíferos exclusivamente aquáticos representados por baleias, botos e golfinhos, e pinípedes, que representam os mamíferos marinhos que alternam entre a vida em ambiente terrestre e aquático, como as focas, lobos, leões e elefantes marinhos.

 

Créditos: Felipe Torres

 

Inicialmente, a metodologia usada foi baseada na análise de amostras. “O primeiro objetivo foi detectar a presença da leptospira sem necessariamente saber se ela interage ou não com os hospedeiros. Percebemos que, ao realizar testes de Reação em Cadeia da Polimerase (PCR), buscando pelo DNA da leptospira nos rins de animais mamíferos encontrados já mortos na praia, poderíamos obter resultados significativos. Então, estabelecemos parcerias com 10 instituições de norte a sul do Brasil, todas seguindo o mesmo  protocolo”, relata Felipe.

Amostras de golfinhos, baleias e lobos marinhos de todos os parceiros foram encaminhadas para o laboratório de bacteriologia veterinária da UFF, onde foram realizados exames moleculares com os tecidos renais dos animais. A partir da análise do DNA, a pesquisa obteve resultados positivos, detectando a presença da bactéria leptospira. Devido a importância dessa pesquisa, o projeto foi premiado internacionalmente pelo Grant da Cetacean Society Internacional e pela International Association for Aquatic Animal Medicine, além de possuir dois artigos publicados.

 


Créditos: Felipe Torres

 

Outra parte importante da pesquisa foi realizada nos Estados Unidos, onde há casos de leptospirose em leões marinhos. “Nos Estados Unidos, essa pesquisa já vem sendo desenvolvida há mais de 50 anos. Foi observado que essa doença pode causar uma inflamação aguda severa nos rins dos animais, levando-os a encalhar nas praias com dores abdominais, magreza, desidratação e, em casos mais graves, óbito. Ainda não foram encontradas evidências de lesões renais nos animais estudados, pois é necessário continuar avaliando outros parâmetros para confirmar se há manifestação clínica da doença em animais marinhos no Brasil”, revela Felipe.

Uma das hipóteses da infecção é de que ela ocorra através de efluentes contaminados com urina de rato, especialmente em áreas litorâneas com maior contato humano, como grandes cidades, áreas portuárias e locais com saneamento básico precário. No entanto, a verdadeira fonte da infecção ainda é desconhecida, sendo necessário uma pesquisa mais aprofundada neste tema para entender o impacto que a bactéria, que transita pelo ecossistema marinho, representa para a conservação das espécies e para a saúde pública.

 


Créditos: Felipe Torres

 

O projeto recebeu o apoio do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), além de apoio financeiro através da premiação do Grant do Cetacean Society Internacional e da International Association for Aquatic Animal Medicine, devido à relevância científica do projeto. O doutorando Felipe também recebeu uma bolsa de doutorado sanduíche para aprofundar sua pesquisa sobre a leptospira na Universidade da Califórnia em Los Angeles (UCLA) e no The Marine Mammal Center (TMMC), ambos na Califórnia, Estados Unidos.

Para encontrar mais dados da pesquisa, leia o artigo “Molecular Detection of Pathogenic Leptospira sp. in Cetaceans from the Brazilian Coast” (2023), de Felipe D’Azeredo Torres, disponível em https://www.researchgate.net/publication/371829654_Molecular_Detection_of_Pathogenic_Leptospira_sp_in_Cetaceans_from_the_Brazilian_Coast. É possível conferir mais informações sobre a pesquisa no artigo “Pinnipeds carriers of pathogenic Leptospira: New data based on molecular characterization”, Felipe D’Azeredo Torres, em https://www.researchgate.net/publication/366880742_Pinnipeds_carriers_of_pathogenic_Leptospira_New_data_based_on_molecular_characterization.

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Felipe D´Azeredo Torres é doutorando no programa de pós-graduação em Medicina Veterinária da UFF em Clínica e Patologia Animal . Graduado em Medicina Veterinária pela Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro (UFRRJ), mestre em Medicina Veterinária pela UFF, e Patologista Clínico Veterinário especializado pelo Instituto Qualittas (UCB). Atua nas áreas de reabilitação e necropsia de aves, tartarugas e mamíferos marinhos , com foco na avaliação de impactos antrópicos e saúde animal.

Walter Lilenbaum é graduado em Medicina Veterinária e mestre em Fisiopatologia da Reprodução Animal pela UFF. É doutorado em Ciências (Microbiologia) pela UFRJ e pós-doutorado em Medicina Veterinária Preventiva pela USP e em Leptospirose (Instituto Pasteur). É professor Titular de Bacteriologia da UFF. Tem experiência na área de Medicina Veterinária e Microbiologia, em Doenças Infecciosas de Animais, atuando principalmente em Leptospirose.

Maria Isabel Nogueira Di Azevedo é graduada em Biomedicina pela UFF, mestre em Ciências pelo Programa de pós-graduação em Biologia parasitária e doutora em Ciências  do Instituto Oswaldo Cruz. Realizou doutorado sanduíche em parceria com a Universidade de Humboldt e foi bolsista de Pós-Doutorado Nota 10 da FAPERJ no Laboratório de Bacteriologia Veterinária da UFF, em que atualmente é pesquisadora no laboratório. Atua na área de parasitologia e bacteriologia, com ênfase em biologia molecular, bioinformática, sistemática molecular, taxonomia integrativa e aspectos gerais das doenças infecciosas e parasitárias e zoonoses.

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