No quesito alimentação, o isolamento social evidenciou basicamente dois tipos de perfis: os focados na preparação das suas próprias refeições, com uma ressalva para os que se despontaram como verdadeiros chefs de cozinha, e também os adeptos das comidas de rua. Com o home office e a falta de tempo pelo excesso de tarefas, certamente, muitos vão se identificar como integrantes desse segundo grupo. Mas como manter uma alimentação regrada e, principalmente, segura com tantas ofertas de delivery, ainda mais em tempos de pandemia?

Hoje o nosso bate-papo é com a professora Manoela da Penha, da Faculdade de Nutrição da UFF e especialista em Gestão da Segurança dos Alimentos, que traz informações bem interessantes sobre a temática.

1 – Com relação à segurança alimentar, quais cuidados devemos ter ao pedir delivery para evitar infecções alimentares e outras indisposições?

Primeiramente, é importante que você conheça o local no qual você irá fazer o pedido. Peça indicações de colegas, verifique a existência do estabelecimento físico, tenha o conhecimento mínimo do local. Muitos deliveries são feitos de lugares que não possuem a estrutura e condições higiênico-sanitárias mínimas adequadas para a produção de preparações alimentares e, por isso, o risco é grande. Devemos ficar alertas com preparações feitas com alimentos crus, como comida japonesa e saladas; e com os hambúrgueres e carnes, que são alimentos mais suscetíveis a contaminação em todas as etapas de preparo, podendo causar algum tipo de doença. É importante lembrar que, dependendo da gravidade da doença, seus sintomas e das características do indivíduo, algumas dessas doenças causadas por alimentos pode levar a óbito.

2 – Por causa da Covid-19, quais procedimentos de higiene devemos ter ao receber refeições prontas em domicílio? É mito ou verdade que devemos esquentar a refeição entregue pelo restaurante e afins para “matar” o vírus?

É importante que medidas de segurança sejam tomadas no momento da entrega. Tanto quem entrega quanto quem recebe devem usar máscaras e fazer a higienização correta das mãos, seja com água e sabão ou com álcool a 70º, antes e depois da entrega. Higienize suas mãos antes e depois de receber e manipular as embalagens das refeições prontas. Ao chegar em sua cozinha, descarte as embalagens, higienize suas mãos e transfira a refeição ou lanche para um recipiente limpo. Antes, verifique se há alguma recomendação de consumo, como “consumir imediatamente”, “aquecer antes de consumir” ou indicações de tempo e condições de armazenamento se o consumo não for imediato. No caso de refeições congeladas e que não serão consumidas de imediato, o ideal é higienizar a embalagem primária (aquela que está diretamente em contato com o alimento) e conservá-la em freezer ou congelador dentro das especificações determinadas. Se a embalagem for de vidro ou lata ou plástico ou qualquer outro material impermeável, pode utilizar água e sabão. Se for alguma embalagem mais porosa, avalie o uso de álcool a 70º. De qualquer forma, não esqueça de higienizar as mãos antes e depois de manipular as embalagens.

Até onde sabemos, o vírus não é transmitido por alimentos, mas pode permanecer em algumas superfícies, como bancadas, talheres, embalagens e nas nossas mãos. Sabemos que além da água e sabão, álcool a 70º e hipoclorito de sódio, temperaturas acima de 70ºC podem eliminar o vírus. Portanto, se você se sentir mais confortável em consumir a preparação aquecida, ok. Porém, uma vez que você tenha feito a higienização correta das superfícies e das suas mãos no momento do recebimento e consumo, não há a necessidade de aquecer o alimento para eliminar o vírus, pois os outros procedimentos se realizados corretamente já o eliminaram.

3 – Nos dias de hoje, até delivery de hortifruti se tornou mais frequente. Como higienizar legumes e verduras que são manipuladas por muitas pessoas para evitar a contaminação por diferentes tipos de doenças, até da Covid-19?

Independente do novo coronavírus é importante que frutas, verduras e legumes sejam higienizados antes do consumo. Para tanto o procedimento é o seguinte:

1) Lave suas mãos para a manipulação dos vegetais.

2)  Em água corrente, lave um por um, folha a folha, para que se faça a retirada das sujidades mais grosseiras, como terra, poeira e partes não aproveitadas. É importante que essa etapa seja feita para a retirada da matéria orgânica. Vale lembrar que a etapa de lavagem em água corrente para retirada da matéria orgânica é super importante para garantir a eficácia do hipoclorito de sódio na próxima etapa.

3) Após a lavagem em água corrente, coloque o vegetal totalmente imerso numa solução clorada por, no mínimo, 15 minutos. O agente ativo dessa solução será o hipoclorito de sódio que, se na correta concentração, consegue eliminar microrganismos e parasitas. Para preparar essa solução, podemos utilizar alguns produtos próprios para a higienização de vegetais, disponíveis no mercado, na forma de comprimidos ou na forma líquida. Apenas verifique no rótulo qual a forma correta de diluição e utilização. No caso do uso de água sanitária, é importante que esta possa ser utilizada para alimentos e não tenha outros componentes na sua composição, como alvejantes e corantes (leia o rótulo antes de comprá-la). Para a formação da solução clorada para a higienização de frutas, verduras e legumes, utilize 1 colher de sopa de água sanitária (cerca de 20mL) para 1L de água.

4) Após 15 minutos, e não mais que 30 minutos, enxágue os vegetais com água potável.

4 – A pandemia da Covid-19 mostrou o quanto as nossas noções de higiene ainda são básicas. O atual momento servirá de alerta para adotarmos novos comportamentos futuramente no setor de alimentação?

Sim. A verdade é que todos os procedimentos de higiene que hoje vieram à tona por conta da pandemia, como a higienização das mãos e dos alimentos (frutas, verduras e legumes) já deveriam fazer parte da rotina dos serviços de alimentação e das nossas casas. Não são novas recomendações e sim um reforço às recomendações e legislações importantes que deveriam ser colocadas em prática há muito tempo. Já o distanciamento é novo e temos que adotar como novo comportamento no setor de alimentação, tanto para funcionários quanto para a clientela, visto que o momento da refeição é o momento de reuniões, de confraternização, que hoje deverão ser reduzidas e distanciadas.

5 – Muitas pessoas pedem comida em casa porque afirmam não saber cozinhar. Existem alimentos nutritivos e de fácil preparo que podem inclusive ser congelados?

As habilidades culinárias nesse momento de incertezas foram fundamentais para que as pessoas pudessem preparar seu próprio alimento e comer com mais segurança e qualidade. Alguns alimentos são fáceis de serem preparados, podem ser previamente preparados e porcionados para o longo da semana, como legumes cozidos, o próprio arroz e feijão, as carnes e aves. Para legumes (cenoura, chuchu, abobrinha, abóbora, brócolis, couve-flor e outros), é possível fazer o que chamamos de branqueamento, que nada mais é do que aquecê-los em água fervente por um pequeno tempo (4 a 5 min) e depois realizar um choque térmico em banho de gelo até que o alimento esfrie e possa ser congelado. Após branqueado, ele poderá ser utilizado em outro momento, apenas colocando-o diretamente em água fervente para terminar o cozimento. Por isso, organização e planejamento são fundamentais: tire um dia para realizar o branqueamento dos vegetais que você irá consumir na semana e mantenha-os congelados e disponíveis para o consumo semanal. As carnes e aves podem ser preparadas (cozidas, assadas ou grelhadas), porcionadas e congeladas também.. Vale lembrar que ao preparar essas carnes e aves, utilize temperos naturais, como alho, cebola, salsinha, cebolinha, hortelã, além de especiarias como páprica, cominho, pimentas, curry que trarão sabor e colorido às suas preparações. Alguns sites disponibilizam receitas variadas e dicas de preparo de alimentos mais saudáveis, inclusive com vídeos de preparo. Peça ajuda a familiares e amigos que possuam habilidades e saibam cozinhar.

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