Notícia

Instituições de ensino discutem na UFF a questão da acessibilidade

Notícia antiga

Esta notícia faz parte de um esforço da Universidade Federal Fluminense de conservar, em acervo, conteúdos de comunicação produzidos anteriormente. Notícias de anos anteriores a 2015 estavam armazenadas originalmente em noticias.uff.br e foram migradas para este website. Informações como e-mails, telefones, links, arquivos etc. poderão não existir atualmente, portanto, recomendamos atenção a leitura.

No 1º Seminário sobre Experiências Inclusivas em Instituições de Ensino Superior, realizado na UFF no dia 28 de novembro como parte da Agenda Acadêmica, professores de várias universidades do Rio e Minas Gerais relataram suas experiências práticas, na tarefa de tornar o terceiro grau mais acessível aos portadores de necessidades especiais, aí incluídos os disléxicos, autistas e superdotados.

Também como parte da Agenda, a atividade “Café no Escuro”, realizada no dia 29, no Campus do Gragoatá, mostrou um pouco das dificuldades dos deficientes visuais. As pessoas – inclusive muitos estudantes de escolas públicas – foram convidadas a tomar café da manhã e a andar de bengala de olhos vendados, servidos e guiados por cegos.

Seminário permitiu troca de experiências

Na Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais, foi criado, em 2005, o Núcleo de Apoio à Inclusão (NAI), com o objetivo de garantir suporte e apoio aos alunos com deficiência visual, auditiva e/ou locomotora, que começa na etapa do vestibular e se estende por todo o percurso acadêmico.

Para os surdos, foi criado o cargo de intérprete, e já são 27 em toda a universidade mineira que acompanham os alunos nas salas e nas atividades extra-classe, além de oficinas de leitura e língua portuguesa, como segunda língua. Atualmente, a universidade trabalha na produção do “Dicionário de Sinais Temáticos”, para facilitar e aprofundar a compreensão das diversas áreas do conhecimento, com sinais específicos de matemática, filosofia ou medicina, porque os intérpretes não têm o domínio de todas as áreas.

Já para os cegos, o NAI garante todo o material didático em braile ou em áudio digitalizado, além de colocar à disposição ledores e copistas, quando for o caso. Na área de deficiência locomotora, a PUC–Minas está trabalhando não só na acessibilidade arquitetônica, como na de interior das salas de aula, pesquisando mobiliário escolar mais acessível. Nem todo deficiente físico é cadeirante. Muitos são usuários de muletas ou de andadores, ou têm problemas de incontinência urinária ou de uso de bolsas coletoras. Para esses, disse a coordenadora do NAI, Maria do Carmo Menicucci, “as carteiras tradicionais são muito desconfortáveis, sendo necessário um mobiliário adaptado às necessidades específicas”. Além disso, acrescentou a professora, “oferecemos alguns recursos tecnológicos e materiais para alunos com seqüelas de paralisia cerebral, como softwares de comunicação alternativa, com acionadores de teclados e mouses adaptados, disponíveis no recentemente criado Laboratório de Tecnologia Assistida, que conta ainda com softwares ampliadores e ledores de tela, impressoras e máquinas braile”.

Para superdotados ou paralisados, o Impa não cria obstáculos

Também no centro de excelência que é o Instituto de Matemática Pura e Aplicada (Impa), do Rio, o professor Paulo Cezar Pinto de Carvalho relatou casos interessantes de uma inclusão que vem se dando da forma mais natural possível. “Não temos estrutura nenhuma especial, só não colocamos obstáculos”, explicou, relatando que o instituto vem apoiando as Olimpíadas de Matemática, da qual participam alunos do Brasil todo, como forma de descobrir talentos.

Em duas ocasiões, afirmou o professor, alunos com deficiência receberam medalhas de ouro, um com paralisia cerebral, que foi inclusive recebido pelo presidente Lula, e outro com problemas, aparentemente, de autismo. O não-comprometimento com as amarras da instrução formal já permitiu que um aluno terminasse seu doutorado lá, com 19 anos, dispensando-o da graduação. Segundo ele, atitudes assim têm permitido que o Brasil se destaque na pesquisa e que alargue sua base de talentos em matemática, ainda que se apresente como um “desastre” no ensino dessa matéria.

Metodologia inovadora na Uerj

Na Uerj, existe desde 2004 o Núcleo de Educação Inclusiva (NEI), que se articula com duas disciplinas obrigatórias nos cursos de licenciatura: Questões Atuais em Educação Especial e Educação Inclusiva no Cotidiano Escolar. De acordo com a coordenadora do NEI, professora Edicléa Mascarenhas, estas disciplinas foram criadas com uma metodologia inovadora, com os futuros profissionais indo a campo avaliar o potencial inclusivo das escolas da rede pública. Além disso, elas contribuem muito para o conhecimento interdisciplinar, por reunirem diferentes pontos de vista acadêmicos, com universitários de Farmácia, Geografia, História, Letras, Física, dentre outras, numa visão mais abrangente de todos os conteúdos, pois, ainda hoje, “as universidades trabalham em departamentos estanques”.

Os resultados têm sido extraordinários do ponto de vista pedagógico, pois, ao criarem, por exemplo, o primeiro modelo atômico, ou a estrutura dos neurônios, ou o funcionamento de uma célula, em estruturas e movimentos que os cegos percebessem, tornaram o aprendizado mais fácil para todos os alunos.

Libras também passará a ser disciplina obrigatória, embora já esteja em quase todos os cursos de licenciatura. O NEI tem ainda o Fórum Permanente de Educação Inclusiva, o Forimpe, para intercâmbio com alunos e instituições diferentes, além de oferecer cursos de braile e Libras para a comunidade.

Sensibiliza da UFF institucionaliza seu atendimento

Na UFF, foi criado em 2007 o Núcleo Sensibiliza, que, inclusive, promoveu seminário e a troca dessas experiências pretendendo reunir as atividades isoladas já realizadas na universidade e promover novas ações coordenadas. Até o momento, os professores que relataram suas experiências isoladas, consideram que a UFF não está preparada para atender aos alunos com necessidades especiais. “Se existe algum mérito na formatura desses estudantes, deve-se ao próprio aluno, que teve uma boa estrutura familiar, emocional e intelectual”, afirmou a vice-diretora do Instituto de Química da UFF, Noemy Cardoso Pugliesi.

Citando o caso de uma aluna deficiente auditiva, Noemy disse que ela não tem tido mais dificuldade do que a maioria dos alunos, pois Química é um curso difícil, cuja média do CR (coeficiente de rendimento) dos alunos é de 5,5, enquanto o da jovem V. é de 6,8. Os professores, entretanto, explicou, não estão preparados para esse tipo de dificuldade, e a aluna tem enfrentado problemas com docentes estrangeiros ou com os que dão aulas virados de costas para a turma – até mesmo o comprimento do bigode pode atrapalhar sua leitura labial. “Porém, mesmo assim, quando V. tranca uma matéria, pode-se saber que muitos farão o mesmo, pois ela é excelente aluna, lê muito, e a dificuldade que sente não é dela, mas da didática. V. não gosta de nenhum tratamento especial e, quando entrou na universidade em 2005, foi, como ingressante, inscrita na prova do Enade”, contou Noemy. Quando foi perguntado se havia algum aluno especial no curso de Química, foi dado seu nome e, ao final, ela reclamou por ter feito a prova em separado dos demais.

De um modo geral, nenhum aluno especial quer tratamentos diferenciados, revelaram todos os palestrantes, apenas condições de cursar e de progredir nas carreiras que escolheram, como os demais estudantes. O Instituto de Química fica no alto do Morro de São João Batista, no Campus do Valonguinho e, como um dos prédios não tem elevador e outro está com o elevador parado há um ano, alunos com dificuldade de locomoção têm de assistir aulas no anfiteatro, que fica no térreo.

Assim, nessas condições de infra-estrutura, a UFF precisa avançar, segundo Noemy, e, “caso o curso de Química venha a ter um deficiente visual, vamos ter de nos adequar muito, porque não temos preparo nem de recursos materiais nem humanos e quando os alunos pedem uma indicação de disciplina para a licenciatura, sempre recomendo a de Tópicos Especiais em Educação Especial, pois hoje não se pode mais formar um profissional sem isso”.

“O aluno que passa num vestibular da UFF é porque tem condições plenas de estar aqui”, explicou a professora Cristina Delou, da Faculdade de Educação, “e nós é que temos de nos preparar para dar a ele condições de adquirir todo o conhecimento disponível, porque ele vai sair com um diploma da UFF”.

Neste ano, como uma das ações do Núcleo Sensibiliza, o vestibular da UFF já foi diferenciado, com os deficientes não mais realizando as provas no Hospital Universitário Antônio Pedro, nem os cegos no Instituto Benjamin Constant, como até então, com ledores e copistas que sabiam línguas, enfim, com uma série de mudanças que resultaram num número expressivo de vestibulandos com deficiência, 212 com deficiências declaradas. Durante o seminário, os palestrantes ainda levantaram, como num exercício de lógica, a suposição de que se 10% deles passar, a UFF terá várias questões concretas para enfrentar.

Pular para o conteúdo