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Pesquisa da UFF soluciona contaminação de represa

O professor Julio Cesar de Faria Alvim Wasserman, do departamento de Análise Geoambiental da UFF, foi convidado, em 2008, pela Associação Mico Leão Dourado (http://www.micoleao.org.br/) para fazer a medição da qualidade da água na represa Juturnaíba – fonte de abastecimento para a Região dos Lagos no Estado do Rio de Janeiro.

A Associação, organização não governamental (ONG), que atua na preservação e recuperação das populações dessa espécie de primata, está localizada na bacia de drenagem da reserva biológica de Poço das Antas, margeada pelas águas dos afluentes da Juturnaíba. O convite ao pesquisador da UFF partiu da preocupação da entidade com a saúde de mais de mil micos leões dourados que fazem uso dessa fonte de recurso hídrico.

Após os primeiros estudos das amostras coletadas no local, detectou-se a presença de alumínio na água. A situação alarmou o especialista principalmente porque esse elemento químico quando dissolvido em água pode provocar a doença de Alzheimer. E a procedência dessa contaminação não era conhecida até aquele momento.

A medição era realizada, semanalmente, nas concentrações de metais pesados e nutrientes da represa Juturnaíba. A pesquisa identificou a poluição pelo alumínio, o que levou a equipe, rapidamente, a tentar descobrir a origem dessa contaminação. “Nós aventamos a possibilidade de que houvesse uma lixiviação dos efluentes das estações de tratamento de água da região”, narra o professor. Por isso, as duas estações de tratamento, ETA Juturnaíba (http://www.grupoaguasdobrasil.com.br/aguas-juturnaiba/agua-e-esgoto/eta/) e Prolagos (http://www.prolagos.com.br/sistemas-de-tratamento-e-distribuicao-de-agua/), presentes na margem da represa, tiveram os seus processos de tratamento analisados.

Embora em outros países o lançamento desse resíduo no próprio ambiente seja proibido, no Brasil é uma prática frequente”, ressalta Walsserman.

Chegou-se a conclusão que o sulfato de alumínio como insumo principal poderia ser empregado para a purificação da água. E, no final do processo de tratamento, esse mesmo sulfato seria lançado juntamente com lodo e sujeira na margem da própria represa. De acordo com o pesquisador “é um processo até curioso, porque eles retiram os sedimentos da água da represa e jogam essa sujeira dentro da própria represa, funcionando como um ciclo. Porém esse ciclo não é sustentável e nem consistente: “Enquanto estão limpando a represa, também estão jogando resíduos dentro dela. Chegará uma hora em que a represa ficará tão suja que não poderão retirar mais aquela água.” completa.

Com a possibilidade da água contaminada chegar às residências, a comunidade local foi alertada para o perigo do Alzheimer. Uma pessoa que consumir a água com esse elemento químico durante 40, 50 anos tem mais chance a contrair a doença do que aqueles que a ingerem durante um curto período de tempo. Aliado a esses fatores, o indivíduo geneticamente propenso, provavelmente, com a exposição em longo prazo, manifestará precocemente a doença. “Nossa preocupação é porque a expectativa de vida está aumentando, é de 75 a 80 anos, então, por isso, a gente ouve falar do Mal de Alzheimer mais hoje do que há 30 anos quando a expectativa era de 60 a 65 anos. Se você vive mais tempo, o nível da exposição ao alumínio aumenta também.”

Após esta constatação, o Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio), que chefia a reserva biológica de Poço das Antas, se juntou com o Ministério Público e com o Instituto Estadual do Ambiente (INEA) para dimensionar a contaminação. Um documento foi emitido solicitando as empresas de água Prolagos e Águas de Juturnaíba que fizessem um estudo das pilhas de rejeitos lançadas na margem da represa. Foi pedida a verificação dos resíduos passivos ambientais quanto a sua estabilidade, buscando o esclarecimento da química dos rejeitos.

Segundo as estações de tratamento da água, o sulfato de alumínio é quimicamente estável à beira da Jaturnaíba. Não se espalha para a coluna d’água. Entretanto, através da análise de medição da qualidade da água no local, foi detectado que, em determinadas condições, o sulfato de alumínio pode não ficar retido, espalhando-se por toda a represa. Os responsáveis pelas estações de tratamento procuraram, inicialmente, o professor Julio Wasserman para elaboração de um orçamento para uma solução – retirada ou contenção – da pilha de rejeitos. Orçado em 700 mil reais, as empresas consideraram alto o custo da operação e não efetivaram o projeto.

“Embora em outros países o lançamento desse resíduo no próprio ambiente seja proibido, no Brasil é uma prática frequente”, ressalta o pesquisador. As estações de tratamento lançaram durante 30 anos uma pilha de rejeitos criando uma espécie de alagado na margem da represa, próximo à estação, onde estava contaminado com alumínio. Com a identificação da quantidade de rejeitos contaminados e a possibilidade de sua disseminação para o restante da represa, o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente (IBAMA), o INEA e o Ministério Público proibiram, em 2009, o despejo de rejeitos feito pela represa de Juturnaíba.

Projeto da análise de rejeitos

Como o professor Júlio já havia preparado um projeto de análise da pilha de rejeitos, incluindo uma solução, este foi então submetido à Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado do Rio de Janeiro (FAPERJ), que aprovou e financiou em grande parte através do programa Pensa Rio. A partir do financiamento da FAPERJ, em 2011, a proposta se tornou um projeto de departamento. Criou-se um laboratório, estabeleceram parcerias e alunos bolsistas integraram o grupo para a análise da pilha de rejeitos.

O coordenador Julio Wasserman explica detalhadamente os procedimentos necessários para a análise : “As amostras, chamadas de testemunho, são levadas primeiramente para o laboratório no campo. São abertas com um aparelho chamado glove bag (sacola-luva), que fica hermeticamente fechado e preenchido com nitrogênio. Com luvas, manipulo o testemunho dentro do glove bag, vou abrindo e colocando as amostras dentro de frascos para evitar qualquer contato com o ar que possa modificar as características físico-químicas do sedimento. Depois disso, encaminho esse material ao laboratório. Faço a liofilização, secagem a temperaturas ultra baixas sem alterar a amostra, e analiso-as”, conclui.

Para a realização da análise, o coordenador do projeto Julio Cesar Wasserman, conta com a parceria de outras três companhias, além da participação do professor Wilson Machado, do Instituto de Geoquímica da UFF: a Embrapa Solos, através do diretor Daniel Vidal Peres; Instituto de Engenharia Nuclear (IEN), com a diretora Maria Angélica Vergara Wasserman, e com o Instituto Federal Fluminense de Quissamã (IFF), por meio do professor Renato Barcelos.

A equipe não se deteve apenas nesse estudo. O projeto também buscou coletar sedimentos ao longo de toda a represa. Coletaram sedimentos do seu entorno e da superfície, com um equipamento chamado Busca Fundo, do tipo van veen. Essa ação foi necessária para saber se os rejeitos estavam se espalhando para a represa. “As concentrações de rejeitos na pilha são muito altas, mas, felizmente, não se espalharam para o restante da represa”, ressalta Julio Wasserman.

Além de alcançar o objetivo inicial do projeto, ou seja, reconhecer se o resíduo era quimicamente estável ou não, foi, também, proposta uma solução economicamente viável para o problema. Calculou-se, primeiramente, a necessidade de realizar 10 mil viagens de caminhão para a retirada completa dos rejeitos. Isto não só geraria um alto custo como também liberaria toxinas com a movimentação da lama, causando um impacto no ecossistema.

A construção de uma espécie de barragem com chapas metálicas foi a solução encontrada, como explica o coordenador: “ A pilha de rejeitos estava depositada em uma minienseada da represa. Assim, optamos por colocar chapas no sedimento para isolar essa pilha. Com isso, não estarão mais em contato com a água da Juturnaíba. Finalmente, fizemos a sobreposição das chapas no solo para o plantio de uma vegetação simplificada, evitando, assim, que essa pilha de substratos ultrapassasse a barreira”.

Segundo Julio Wasserman, o resultado final do projeto atendeu totalmente seu objetivo, isto é, identificar se o resíduo encontrado na represa era quimicamente estável ou não. Além disso, conseguimos reter a poluição daquele sistema de uma forma economicamente viável, conclui o professor. No mês de maio, ele apresentará sua tese de doutorado sobre o tema, no departamento de Geoquímica do Instituto de Geociências da UFF.

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