A cada dia, as constantes mudanças na nossa sociedade levam à criação de diferentes demandas nos mais variados aspectos da vida social e pensar em soluções inovadoras que contemplem essas novas necessidades é também papel da universidade. Nesse cenário, a UFF conta com sua própria incubadora de startups: a Agência de Inovação (Agir). A função principal da incubadora é prestar a assessoria e o suporte necessários para que as empresas emergentes, ou startups, possam se consolidar, como foi o caso da plataforma criada para conectar mulheres, a Elza.
De acordo com o diretor da Agir, o professor Ricardo Leal, as startups visam encontrar respostas para questões e problemas das sociedades pós-modernas, globalizadas e conectadas e muitas vezes não sabem se seu produto, serviço ou plataforma funcionará no mercado e trará bons resultados. “Uma incubadora é similar a uma incubadora de nenéns, que necessitam de alguma proteção especial. Pegamos uma empresa ou uma ideia que ainda vai virar empresa, damos apoio para que ela se transforme e ganhe fundamentação, estando assim pronta para deixar a incubadora”.
A plataforma digital Elza, que surgiu na Agir, tem como objetivo criar uma rede de apoio entre mulheres e foi criada pelos ex-alunos da UFF, Thomas Hanssen, que fez um MBA em Gestão de Projetos na universidade e Thiago Diogo, mestre na área de Sistemas de Gestão pelo Laboratório de Tecnologia, Gestão de Negócios e Meio Ambiente da UFF (Latec). Além deles, o projeto conta com apoio da ex-aluna de Engenharia de Produção, Rebeca Elian.
Desde os anos 90, quando surgiu a incubadora, mais de 30 outras empresas já foram apoiadas e lançadas no mercado. A Ayra, por exemplo, um estúdio de desenvolvimento de jogos que hoje atende clientes como Fox, Telecine e Coca-Cola, foi uma das participantes. O chefe da Divisão de Incubadoras da Agir, Álvaro Eduardo, explica que atualmente 3 empresas com propostas bem diferentes estão incubadas na agência. Uma delas, a Domain Expert é uma companhia de consultoria em engenharia que traz para o mercado inovações através de inteligência artificial, data mining e software inteligente de EPI’s (equipamento de proteção individual). Já, a Displace trabalha com realidade virtual aumentada ou VR (do inglês, Virtual Reality) e traz para o mercado parcerias no desenvolvimento de projetos com os segmentos de segurança e turismo. A terceira, Ambmet, opera com a previsão e monitoramento de chuvas e do nível dos rios, temas esses relacionados ao custo de produção da energia.
Álvaro Eduardo ainda relata que essa busca por soluções faz parte do viés central dessas empresas. “A solução e a inovação estão incluídas no plano de negócio de cada uma delas. Qualquer que seja a área, ela tem que solucionar uma dificuldade de mercado. Um problema científico, algo que não existe ainda. Tem que haver sempre uma inovação. Trabalhamos com pesquisa aplicada, com um conhecimento que já temos para fabricar o produto final. Esse é um avanço importantíssimo para as pesquisas básicas produzidas pela universidade.”
A Plataforma Elza
A ideia da criação da rede de apoio de mulheres Elza surgiu a partir da constatação das diversos obstáculos encontrados no dia a dia do público feminino. Nos seis primeiros meses de 2018, por exemplo, a Central de Atendimento à Mulher registrou mais de 79 mil casos de violência. Já outro estudo, do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA), divulgada em outubro do último ano, indica que a mulher negra é a que mais sofre com as oscilações no mercado de trabalho. E em 2017, a Fundação Getúlio Vargas (FGV) divulgou em pesquisa que 48% das mulheres são demitidas após licença maternidade. Esses são apenas alguns exemplos de problemas sociais para os quais a plataforma foi idealizada.
Atualmente, Elza opera com duas principais vertentes, são elas: Ajuda – conectando uma rede de mulheres que precisam de ajuda e mulheres que querem ajudar, e Empregos. Thomas Hanssen relata que reconheceu um dilema quando sua filha, uma adolescente de 17 anos na época, foi seguida durante seu caminho da escola para casa. “Assim que soube do ocorrido, percebi que poderia usar meu conhecimento na área de TI para fazer algo, pois a distância entre nós – eu morava no Rio de Janeiro e ela, no interior do estado -, dificultava o meu suporte, relata. A identificação do problema foi o ponto de partida para a criação da Elza, mas, com a necessidade diversificada do seu público alvo, o projeto sofreu diversas modificações para se adequar a essas demandas.
Hanssen explica ainda que o foco na questão do mercado de trabalho surgiu após a maioria dos pedidos de auxílio terem sido referentes a esse tema nos primeiros 3 meses da plataforma no ar. “Depois de um mês, já com quase 300 usuárias, descobrimos que 60% dos pedidos de ajuda não era sobre segurança, não era sobre direitos, não era sobre relacionamentos, eram pedidos de empregos. Com o país em crise, acho natural que essa demanda surgisse, mas não imaginávamos que seria tão grande”.
Recentemente, a plataforma foi selecionada para fazer parte do Madan Parque, em Portugal. Este centro de desenvolvimento de ciências e tecnologia, estabelecido em 1995, busca conectar o mundo acadêmico com as empresas, oferecendo serviços como os de incubadora e coaching. Para Rebeca Elian, essa experiência Portugal possibilitará novos aprendizados e um trabalho em equipe entre os sócios e parceiros da iniciativa. “A experiência de ver como o mercado lá fora trata essas questões é muito importante. Ver o que podemos adaptar para a realidade do Brasil e trazer para o que fazemos aqui é muito rica. E enquanto o Thomas está testando e validando a plataforma e o chatbot naquele país, vamos daqui testar, falando diretamente com essas mulheres e em paralelo começar a conectar e conscientizar empresas sobre a inclusão de mulheres no quadro de funcionários. Tratar do lado humano aqui, enquanto ele cuida do software lá”.
Rebeca reitera que passou pela experiência de perder seu emprego após retornar da licença maternidade e mostra que existe a necessidade de reinserir as mulheres ao mercado, principalmente após se tornarem mães. “É um problema que eu vivi. Temos dados recentes sobre como quase metade das mulheres são demitidas ao retornarem da licença e que 75% delas resolvem empreender depois de ter filhos. Nós mudamos muito depois dessa experiência. Então, é importante descobrir o que se quer fazer novamente. Ou até ter oportunidade de voltar para o mercado, o que também é muito difícil”.