Cidade costeira situada na Região dos Lagos, no Rio de Janeiro, Arraial do Cabo é reconhecida pela paisagem paradisíaca e pelo clima ameno, sendo um dos principais pontos de atração do turismo no estado. Para além do reconhecido destino de lazer, a cidade também tem grande destaque enquanto reserva ecológica: o município possui um ecossistema único, chamado de “oásis coralíneos”, onde se encontra uma grande abundância de corais, bastante sensíveis à degradação ambiental que vem acompanhada da pesca, do turismo intenso e até mesmo de atividades recreativas.
Com isso, o Projeto Costão Rochoso, associado ao Laboratório de Ecologia e Conservação de Ambientes Recifais da Universidade Federal Fluminense (LECAR-UFF), tem o objetivo de promover a conservação e preservação da fauna e da flora da região. Por três anos, o projeto recebeu financiamento do Fundo Brasileiro para a Biodiversidade (FUNBIO) e, neste ano, passou a contar com apoio financeiro da Petrobras, através do Programa Petrobras Socioambiental, para estudar os ecossistemas marinhos do município. “Tenho uma carreira construída em Arraial do Cabo desde o mestrado, trabalhando no Instituto de Estudos do Mar Almirante Paulo Moreira (IEAPM). É uma longa jornada de estudo para entender a construção do ecossistema e como conservá-lo”, explica o professor Carlos Eduardo Leite Ferreira, coordenador do projeto.
Além de pesquisar o ecossistema, o Projeto Costão Rochoso também trabalha com outras frentes. A primeira delas, como explica a bióloga e pesquisadora do projeto Juliana Fonseca, é o monitoramento da região, com levantamento de dados para a gestão da Prefeitura Municipal e da reserva ecológica, já que “Arraial do Cabo é uma reserva extrativista marinha, então precisa de informações para o gerenciamento e para promover a conservação dos recursos”. Assim, o grupo de pesquisadores do projeto realiza o monitoramento dos animais do local e também analisam a fauna da região entre marés, onde estão os organismos sempre cobertos pela água ou que vivem na faixa de transição entre os ambientes marinho e terrestre. Em 2019, por exemplo, durante uma onda de calor intensa na região, o projeto atuou acompanhando o branqueamento e a recuperação dos corais do ecossistema.
Manejo de tartaruga marinha / Acervo pessoal
Para a coleta de informações, o grupo usa sensores acústicos em alguns dos animais do ambiente, como peixes e tartarugas. Um dos objetivos é entender em quais áreas esses animais passam mais tempo e como está a situação dessa região em termos de conservação. “A gente tem um sistema que consegue captar por onde a tartaruga ou o peixe passa e depois, a partir desses dados, conseguimos saber qual área que estão usando, por onde estão passando e se eles se locomovem muito de um lado para o outro”, explica a pesquisadora. Especificamente quanto às tartarugas, a bióloga conta que os integrantes do projeto realizam também um exame médico com o animal ao capturá-lo, medindo-o e pesando-o antes de inserir os sensores acústicos para então devolvê-lo ao mar.
Outro aspecto do Projeto Costão Rochoso é a capacitação, em que os pesquisadores trabalham buscando informar a comunidade de Arraial do Cabo sobre a pesquisa e as formas de preservar o ambiente marinho da região. “Trabalhamos muito com a prefeitura da cidade em termos de capacitação e educação. Fazemos a capacitação de professores, pescadores, guardas-ambientais e, agora, estamos com uma tentativa de realizar a capacitação dos turistas com a cartilha que produzimos”, comenta Juliana. Com os professores da cidade, houve um curso de capacitação para mostrar o material produzido pelo projeto e como usá-lo, já com os pescadores, a capacitação foi em primeiros socorros das tartarugas marinhas, principalmente quando acabam presas nas redes de pesca. “Também fazemos a capacitação de jovens líderes contra as mudanças climáticas, principalmente meninas; de mergulhadores, para atuarem como monitores de espécies exóticas, como o peixe-leão, e para o turismo de base comunitária”, continua.
O desejo é multiplicar a importância da conservação do ambiente, promover o conhecimento e a valorização do município, além de incentivar o pertencimento das comunidades locais que interagem diretamente com o ecossistema marinho da cidade e, muitas vezes, fazem uso dele para a subsistência. “A gente busca estimular o pertencimento dessas pessoas que estão ali em Arraial do Cabo, que vivem da pesca e do turismo. Estimulá-las a conhecer e também saber o que elas já conhecem. Nossa intenção é fazer com que elas consigam entender a importância do projeto”.
Integrante do Projeto Costão Rochoso com alunos do Instituto Federal do Rio de Janeiro – Campus Arraial do Cabo / Acervo pessoal
Por último, o projeto também trabalha com a educação básica. Desde o início do programa, foram 13 eventos realizados em escolas, com a participação de 874 alunos ao todo. Na Educação Infantil, o grupo trabalha com oficinas para educar as crianças e com a produção de materiais pedagógicos que possam ser usados pelos professores para replicar conhecimentos em colégios de cidades além de Arraial do Cabo. Já no Ensino Fundamental e no Ensino Médio, o projeto realiza oficinas itinerantes, com atividades educativas e apresentando os organismos do ecossistema monitoramento para conscientizar sobre a preservação desse ambiente e das espécies que vivem nele. Em épocas de alta do turismo, esses programas também são realizados em praça pública para amenizar os impactos da chegada de muitas pessoas à cidade.
Somado a todos esses aspectos, o grupo também realiza ações de limpeza nas praias e capacitação dos responsáveis pelos quiosques da cidade para melhor uso dos resíduos e da destinação deles. Essas ações são todas pensadas em parceria com a Prefeitura Municipal de Arraial do Cabo, com o fim de buscar saber quais são as áreas mais afetadas pela ação do turismo, quais necessitam de zoneamento ou de projetos mais intensos de preservação e quais têm maior passagem de barco, por exemplo. A intenção dos pesquisadores é obter essas informações de base para conseguir saber melhor como gerenciar a região: “Fazemos a capacitação com o intuito da multiplicação. A gente capacita para que células levem para outras células. Por exemplo, é muito importante capacitar os professores porque não conseguimos atender todos os alunos da rede pública da região com as nossas atividades nas escolas, mas, se a gente capacita um professor, aquele professor pode passar aquele conhecimento para todas as escolas em que trabalha, então a gente leva para um e aquilo vai se amplificando”, avalia a bióloga.
Integrantes do projeto em oficina de capacitação / Acervo pessoal
Arraial do Cabo trata-se de um ambiente muito sensível, especialmente a área do Costão Rochoso, por ser uma faixa de transição entre os territórios marinho e terrestre, e que vive uma situação muito complexa por conta do turismo intenso e pelo lixo produzido, além de todas as outras atividades econômicas e recreativas desenvolvidas no local. Todas essas ações têm múltiplos impactos nessa que é uma das “unidades de conservação mais visitada do país”, como define a pesquisadora do projeto. Para o professor Carlos Eduardo Leite Ferreira, o Projeto Costão Rochoso é relevante para o local justamente por incluir vários objetivos, que vão da pesquisa à capacitação. “Para a região, é bastante importante existir um apelo ecológico, mas também social, porque os objetivos na parte social auxiliam a gente a entender melhor as prioridades em termos de manejo de conservação. Não dá para gente manejar, conservar, a espécie se não tivermos alguma abordagem social também, então a gente tem que lidar com isso o tempo todo”, analisa.
Além das atividades realizadas presencialmente, o Projeto Costão Rochoso possui uma série de canais para divulgação de informações. Para saber mais, é possível acessar o site desenvolvido para o programa: https://www.costaorochoso.com.br/inicio.
Carlos Eduardo Leite Ferreira Graduado em Ciências Biológicas pela Universidade Santa Úrsula (USU), com mestrado e doutorado em Ecologia e Recursos Naturais pela Universidade Federal de São Carlos (UFSCar). Atualmente, é professor do Departamento de Biologia Marinha da Universidade Federal Fluminense e coordena o Laboratório de Ecologia e Conservação em Ambientes Recifais (LECAR-UFF).
Juliana Fonseca Graduada em Biologia e mestre pelo Programa de Pós-Graduação Dinâmicas dos Oceanos e da Terra pela Universidade Federal Fluminense (UFF). É pesquisadora do Laboratório de Ecologia e Conservação em Ambientes Recifais (LECAR-UFF) e doutoranda pelo Programa de Pós-Graduação em Ecologia da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ)