O tão festejado verão carioca, que lota as praias do Rio de Janeiro, é também um período aguardado com receio por muitas famílias moradoras do estado. A ocorrência de desastres naturais nesse momento do ano, marcado por chuvas intensas e prolongadas, é bastante frequente, com destaque para os deslizamentos de encostas e inundações. De acordo com levantamento realizado pelo Anuário Brasileiro de Desastres Naturais, em 2010, dentre os estados com mais de 30 ocorrências de desastres naturais, o Rio de Janeiro aparece em primeiro lugar, concentrando 18% dos episódios.
Para a pós-graduanda em Geografia pela Universidade Federal Fluminense, Marina Aires, e o pesquisador e professor do Departamento, Jorge Luiz Fernandes Oliveira, estudiosos do fenômeno, alguns fatores explicam essa ocorrência, como a configuração do relevo, a concentração demográfica aliada à ocupação desordenada em áreas de risco, a falta de planejamento urbano e o clima característico do local, fazendo desta uma das regiões que mais sofrem com desastres de origem natural no país.
Apesar de o maior volume pluviométrico estar mais concentrado no período do verão, ele também pode acontecer em outros períodos do ano. De acordo com os pesquisadores, o estado do Rio de Janeiro é influenciado por fenômenos atmosféricos que, dependendo das suas características e intensidades, também podem deflagrar desastres, a exemplo dos chamados “Sistemas Frontais”, da Zona de Convergência do Atlântico Sul e da atuação de ciclones extratropicais e subtropicais. O que chama a atenção, segundo os pesquisadores, não é exatamente, portanto, a concentração do fenômeno nesse período do ano, mas o aumento dos registros de desastres naturais com o passar do tempo.
De acordo com Marina e Jorge, o primeiro registro oficial da ocorrência de um episódio de chuva intensa com fortes rajadas de vento seguida de inundações e desabamentos em toda a cidade do Rio de Janeiro data de 1756. O registro seguinte de um incidente similar ocorreu apenas no ano de 1811. Um longo intervalo de décadas também separou esse evento do que o sucedeu no tempo, no ano de 1864. Os pesquisadores destacam que a diminuição desse intervalo ocorre no século XX, sobretudo a partir da década de 1950 e com uma nova intensificação nas décadas de 1990 e 2000, período a partir do qual a frequência de incidentes com essa proporção passou a ser anual, passando a acontecer, inclusive, mais de duas vezes ao ano.
As razões por trás do aumento do fenômeno estariam relacionadas, de acordo com os pesquisadores, com o crescimento populacional, a ocupação desordenada dos solos urbanos, o intenso processo de industrialização, assim como a impermeabilização dos solos, o desmatamento, o assoreamento dos corpos de água, a concentração de calor e a poluição ambiental. Segundo o The Emergency International Disaster Database, que está relacionado ao Centre for Research on the Epidemiology of Disasters (CRED), organização que concentra estudos sobre a ocorrência de desastres em nível internacional, nos últimos 20 anos de dados (1998 – 2018) a categoria do desastre natural mais registrado foi o hidrológico, seguido do meteorológico, geofísico e biológico. Com relação à classificação dos tipos de desastres, os deslizamentos foram os mais registrados, seguidos das tempestades, e de outros tipos, como epidemias, secas e terremotos.
Mesmo com o passar dos séculos, portanto, e com o advento de novas tecnologias, principalmente no sentido de previsão de tempo, mapeamentos de áreas de risco, papel da Defesa Civil e engajamento da população, os pesquisadores sinalizam que eventos como esses seguem causando inúmeros prejuízos econômicos, sociais, ambientais. E, apesar de as inundações serem os processos que produzem as maiores perdas econômicas e os impactos mais significativos na saúde pública, são os deslizamentos que geram o maior número de vítimas fatais. Segundo eles, “este fato justifica a concepção e implantação de políticas públicas municipais específicas para a gestão de risco de deslizamentos em encostas”, finalizam.