Há poucos meses, noticiários de todo o Brasil deram ampla cobertura à precariedade das condições orçamentárias de algumas das principais instituições de ensino superior públicas do país – dentre elas, a UFF – frente ao atual projeto de desmonte e aos cada vez mais frequentes ataques. Apesar disso e em meio a muitas reestruturações internas, processos criativos e parcerias, a ciência parece não encontrar obstáculos para seguir seu curso de desenvolvimento na Universidade. O mais recente exemplo disso é o projeto, em vias de ser concretizado, de implantação do primeiro Laboratório de Fabricação Digital em um hospital universitário no Brasil, batizado de Fab Lab Health, Science & Education.
Para o reitor Antonio Claudio Lucas da Nóbrega, “este é mais um fruto do Programa de Desenvolvimento de Projetos Aplicados – PDPA, uma parceria que construímos entre a UFF, a Prefeitura Municipal de Niterói e a Fundação Euclides da Cunha, com o objetivo de elaborar e executar ações que impactam a qualidade de vida dos cidadãos de Niterói, valorizando o alto nível do nosso corpo acadêmico. O Fab Lab Health, Science & Education do HUAP-UFF é um projeto inovador, formado por uma equipe extremamente profissional, que trará grandes benefícios para a população”.
Trata-se de um ambiente de fabricação digital, que busca estimular os alunos na resolução de problemas, composto por impressoras 3D, cortadoras a laser, equipamentos de montagem e computadores, através dos quais se idealizam e executam protótipos de produtos. No caso desse Fab Lab em particular, que será implantado no Serviço de Radiologia do Hospital Universitário Antonio Pedro (HUAP), o intuito é o de desenvolver um trabalho inovador na área da educação por meio de uma colaboração com professores da educação básica do município.
a impressão dos modelos de órgãos é utilizada para planejar cirurgias complexas, avaliar estratégias de radioterapia, educar pacientes sobre doenças. E, além disso, são muito usados para o ensino de estudantes de medicina e de outras áreas de saúde”, coordenador da Pós-Graduação em Ciências Cardiovasculares da UFF, professor Claudio Tinoco.
A equipe de integrantes e parceiros do projeto, de natureza multidisciplinar, é extensa e envolve docentes e técnicos administrativos da Universidade Federal Fluminense; dentre eles os professores: Alair Sarmet do Departamento de Radiologia, Aurea Gripa da Faculdade de Medicina, Cristina Delou da Faculdade de Educação, Cristina Fontes do Departamento de Radiologia, Dan Magliano do Departamento de Morfologia, Evandro Tinoco do Departamento de Cardiologia, Flávio Seixas do Instituto de Computação, Lucas Getirana da Engenharia, e o físico Fernando Fernandes, gestor da área de imagem do HUAP. Graduados e pós-graduandos também colaboram ativamente, assim como professores de outras universidades, estudantes de ensino médio e de escolas de ensino fundamental de Niterói.
De acordo com o coordenador da Pós-Graduação em Ciências Cardiovasculares da UFF, que está à frente dessa iniciativa, professor Claudio Tinoco, um dos principais objetivos é “estimular o pensamento, desenvolver o interesse pela ciência e integrar os alunos na chamada educação 4.0, termo que se refere à quarta revolução industrial, à revolução da internet, da digitalização, da coleta e análise de dados. Preparar os jovens de hoje para esta realidade é uma missão da universidade. O Fab Lab Health, Science & Education do HUAP-UFF fará esta ponte de união entre a academia e esta educação inovadora”, explica.
A professora aposentada da Faculdade de Educação Cristina Maria Carvalho Delou, também integrante do projeto, destaca que: “o acesso aos níveis mais elevados de ensino via projeto de extensão da universidade abre portas e oportunidades para os estudantes que não possuem familiaridade com a academia, considerando o fato de os estudantes do ensino fundamental municipal serem oriundos de famílias de baixa renda, usuários de tecnologias da comunicação de baixo custo e que não oferecem condições adequadas para suportarem o ensino remoto de qualidade. A Educação 4.0 se caracteriza pelo acesso à informação via web”.
O primeiro projeto em curso do Fab Lab envolve a integração de estudantes das escolas de Niterói na produção de protótipos do coração, entendendo a anatomia e fisiologia do órgão, assim como também conteúdos de computação, física, química e matemática, necessários para a escolha das características dos materiais utilizados nessa fabricação. De acordo com Claudio Tinoco, faz-se uso de imagens de exames, como Ecocardiograma, tomografia computadorizada, ressonância magnética e medicina nuclear, para produzir os modelos tridimensionais para impressão 3D.
mais de 95% dessa produção científica do Brasil nas bases internacionais se deve à capacidade de pesquisa de suas universidades públicas. O Brasil ocupa o 13º lugar em produção científica no mundo e isto está relacionado ao papel crucial desempenhado pelas universidades públicas”, coordenador da Pós-Graduação em Ciências Cardiovasculares da UFF, professor Claudio Tinoco.
O coordenador informa também que “a impressão dos modelos de órgãos é utilizada para planejar cirurgias complexas, avaliar estratégias de radioterapia, educar pacientes sobre doenças. E, além disso, são muito usados para o ensino de estudantes de medicina e de outras áreas de saúde”, enfatiza. E não para por aí: o projeto abrange a busca de outros tipos de soluções no âmbito da saúde; por exemplo, no planejamento de cirurgias, no combate ao COVID-19, na melhoria da qualidade de vida e na elaboração de produtos nacionais na área.
Para Flávio Luiz Seixas, que atua no projeto coordenando ações envolvendo o uso e a produção de ferramentas computacionais para o espaço do Fab Lab, o fato de ele estar instalado dentro do HUAP representa uma inovação para a saúde. “A ideia é modelar e imprimir modelos tridimensionais que possam simular as características e o comportamento de organismos do corpo humano, como o coração e o aparelho circulatório. Outra iniciativa é estudar e demonstrar os efeitos de doenças em determinadas partes do corpo, convertendo estruturas anatômicas obtidas de escaneamentos da medicina nuclear para modelos físicos tridimensionais. Esperamos também preparar conteúdo didático acessível para estudantes de diversos níveis de formação, apoiando a educação, e despertando a curiosidade e o interesse científico.
Apesar da redução dos investimentos nas universidades públicas, destaca o coordenador, “mais de 95% dessa produção científica do Brasil nas bases internacionais se deve à capacidade de pesquisa de suas universidades públicas. O Brasil ocupa o 13º lugar em produção científica no mundo e isto está relacionado ao papel crucial desempenhado pelas universidades públicas. A universidade tem que se voltar para oferecer produtos para a sociedade, estimular a inovação e o empreendedorismo. Isto contribui para que o país alcance mais rapidamente uma autossuficiência tecnológica. Nesse sentido, o Fab Lab é pedra inicial de estímulo a esta cultura de inovação tecnológica”.
Entusiasta do projeto e fiel escudeiro da ciência, Claudio Tinoco finaliza ressaltando que ela é fundamental para o país sair da posição difícil em que se encontra. “É através da ciência que temos comida para alimentar a população; temos o computador que escrevemos este texto; temos a vacina que está salvando vidas e nos permitindo sonhar com o fim desta pandemia. A ciência nunca foi tão essencial e, ao mesmo tempo, tem sofrido uma série de ataques. Este é o seu objetivo central: contribuir para o bem comum da sociedade. Na UFF, temos isso como lema maior e, por esse motivo, acreditamos que iniciativas como o Fab Lab, que aproximam a universidade da sociedade, têm tudo para serem bem-sucedidas”.