A partir do interesse em estabelecer debates sobre a questão da liberdade religiosa na sociedade – principalmente através das escolas –, os docentes do departamento de História da UFF Campos, Erika Arantes e Rodrigo de Castro, fundaram o grupo de pesquisa denominado Relações Étnico-raciais e Religiões Afro-brasileiras (Reafro). Como parte da iniciativa, foi criado, também, o curso sobre intolerância religiosa, que almeja expandir os questionamentos acerca do tema nas instituições de ensino, considerando a importância da inclusão dos professores da educação básica nas atividades.
O projeto busca conscientizar principalmente os educadores, que são os que lidam cotidianamente com situações de preconceito em sala de aula, levando em conta a importância do ensino pautado no respeito e na inclusão. “Acreditamos que cada professor e futuro professor levará esse debate para sua escola, objetivando uma educação que não discrimine, mas que acolha”, reflete Erika.
É preciso que escolas e professores se engajem na luta antirracismo”, enfatiza Erika.
Fruto de um edital lançado pela Pró-Reitoria de Extensão UFF (Proex) em parceria com a Fundação Palmares, voltado para a temática da Liberdade Religiosa, o curso – que teve início em 25 de maio de 2017 –, propõe debates sem hierarquias de saber, ou seja, um local onde todos aprendem e ensinam a partir dos encontros. Nessa perspectiva, o curso conta com convidados que, além de desenvolverem estudos relacionadas à questão das religiões afro-brasileiras, também são educadores da rede pública e/ou possuem uma militância em torno dessa questão, como os pesquisadores Fernando Sousa, Pedro Castanheira de Freitas, Mannu Ramos, Luiz Rufino, Pauline Idelfonso, Clé Almeida e Rosa Maria Moreira Salles.
Apesar da grande procura – cerca de 500 inscritos – o fato é que ainda existe resistência quando se trata de Religiões Afro-brasileiras. Críticas, exclusão dos praticantes e até mesmo agressões são, infelizmente, recorrentes no país. Na universidade também existe rejeição à temática, no entanto, alunos de diversas religiões participam do curso de extensão, o que pode refletir, no futuro, em avanços no respeito às diferenças.
E no que depender do Reafro, a desconstrução de preconceitos referentes às diversas religiões será cada dia mais presente na sociedade brasileira. “Ao final do curso, como fruto das discussões, elaboraremos um documento, a ser levado ao poder público, com propostas de contribuições para a erradicação da intolerância religiosa nas escolas”, informa a professora Erika.
A seguir, Erika Arantes explica um pouco mais sobre a relação entre racismo e educação no Brasil.
Como está a situação atual da intolerância religiosa nas escolas?
Infelizmente, estamos bem longe do ideal. Os relatos que chegam para nós, e minha própria experiência de quase dez anos como professora de escola básica, mostram como as religiões afro-brasileiras ainda são alvo de preconceito e discriminação. Devemos lembrar que essa situação se relaciona diretamente com o racismo estrutural presente em nossa sociedade e a escola reflete o comportamento racista. Esse racismo, traduzido em atos discriminatórios, ocorre entre os próprios alunos – com violência e exclusão dos adeptos dessas religiões –, mas também vem dos próprios educadores e direção, que reproduzem esse processo violento e exclusivo.
Como a discriminação pode ser combatida?
Para combatermos a discriminação às religiões afro-brasileiras, é preciso combater não só o racismo, mas também os mecanismos sociais e econômicos que garantem a sua reprodução. E nisso, a educação tem um papel fundamental. É preciso que escolas e professores se engajem na luta antirracismo. Os educadores não podem fechar os olhos para a questão, não podem achar que “é brincadeira normal de criança”.
Qual o papel da escola no combate à discriminação?
A escola precisa intervir em casos de discriminação e promover atividades que visem o combate a ações discriminatórias. Além disso, é preciso discutir os currículos escolares, ainda muito pautados em uma visão eurocêntrica e excluindo outros saberes e temporalidades. Para tanto, é preciso que as licenciaturas, cursos de formação de professores, contribuam para que esses educadores sejam formados numa perspectiva educacional não racista, que leve em conta todas as diferenças – raciais, culturais, sociais, entre outras -, e que explicite as relações de poder que estão por trás da produção das desigualdades.
Qual a importância de iniciativas como o curso sobre intolerância religiosa para a sociedade em geral?
Acho que a importância é trazer o debate e espalhar a reflexão. Esperamos que os professores e também nossos alunos (a maioria futuros educadores) saiam desse curso mais instrumentalizados para tratar a questão da intolerância em suas escolas. Também acho fundamental a democratização do espaço da universidade, estreitando o diálogo entre esta, os professores e os movimentos sociais de luta contra a discriminação.