No mês de comemorações ao 1º de dezembro – Dia Mundial de Luta contra a Aids – dados do Ministério da Saúde (MS), referentes ao período de 1980 a junho de 2015, mostram que o Brasil registrou 798.366 casos de Aids nos últimos 35 anos. Atualmente, estima-se que sejam 734 mil pessoas vivendo com HIV e demais enfermidades decorrentes da doença e 150 mil não sabem que estão com o vírus. No pico da epidemia, em 1995, o país teve cerca de 15 mil óbitos, contra 12.449 em 2014. O número caiu, a epidemia se tornou mais silenciosa, mas continua matando.
De acordo com a nova edição do Boletim Epidemiológico de HIV/Aids, lançada no início deste mês, em Curitiba (PR), a taxa de detecção de casos de Aids em 2016 foi de 18,5 casos por 100 mil habitantes – uma redução de 5,2% em relação a 2015, quando foram registrados 19,5 casos. Já quanto à mortalidade, observa-se uma queda de 7,2%, a partir de 2014 (quando foi ampliado o acesso ao tratamento para a população), passando de 5,7 óbitos por 100 mil habitantes para 5,2 óbitos, em 2016.
Segundo o chefe do Serviço de Atendimento Especializado aos Pacientes com Aids do Hospital Universitário Antonio Pedro (SAE-Huap), o infectologista Cláudio Palombo, no Brasil, a prevalência da infecção pelo HIV encontra-se em 0,4% na população geral. Envolvido diretamente na assistência a essa parcela da sociedade, o Huap atende atualmente cerca de 600 pessoas infectadas pelo HIV e inscritas na farmácia do hospital para retirada de medicamentos.
O perfil dos pacientes, acrescenta o professor, é de qualquer pessoa que faça sexo sem proteção. “Assim, ela está sujeita a se infectar com o vírus HIV, hepatites ou qualquer outra infecção sexualmente transmissível – IST. Não existe perfil ou grupo determinado, para que a pessoa possa se contaminar com vírus da Aids, bem como não há grupo de risco para se infectar”, ressalta.
Se não conseguirmos sensibilizar nossos profissionais de saúde e os jovens, (…) teremos ainda muitas pessoas infectadas no Brasil”, Cláudio Palombo.
Palombo esclarece que as mudanças ocorridas nos últimos anos, no que se refere ao início da terapia antiretroviral, utilizada também no Huap, seguem as orientações do comitê do Ministério da Saúde, para tratamento das pessoas vivendo com HIV/Aids. O que se quer, em outras palavras, explica o médico, é que o tratamento seja logo iniciado em todos, independente do tempo de diagnóstico ou da condição clínica do paciente, “Se uma pessoa descobriu ser portadora de HIV hoje e deseja iniciar a terapia, começa-se hoje mesmo”, afirmou.
Segundo o infectologista, o paciente passa por uma avaliação médica, com o intuito de verificar se é portador de outras doenças oportunistas (comorbidades), por exemplo, tuberculose ou outras enfermidades, que mudariam um pouco o esquema na prescrição dos medicamentos. No entanto, a estratégia utilizada atualmente não visa mais retardar o início do tratamento, como era feito no passado, onde os médicos esperavam para avaliar exames de sangue, da quantidade de vírus circulando (carga viral) ou do estado da defesa do organismo (contagem de glóbulos brancos CD4).
Para o especialista, outra questão importante que deve ser destacada dentro desse contexto é que os últimos dados epidemiológicos mostram um aumento de infecções em jovens. “Muitas vezes causadas pela falta de abordagem do tema na escola, na família ou pelos próprios profissionais de saúde que não falam sobre sexualidade, num momento de grande vulnerabilidade”, explica. O médico acrescenta que a ausência de campanhas que abordem o tema e métodos preventivos fora dos períodos festivos – Passeata LGBT, 1º de Dezembro, Reveillon e Carnaval – podem influenciar o aumento das infecções entre esse perfil etário.
“Se não conseguirmos sensibilizar nossos profissionais de saúde e os jovens, adultos e idosos para conversarem abertamente sobre sexualidade, procurando auxiliar um ao outro na escolha do melhor método de proteção, ao invés de simplesmente impor o uso da camisinha, teremos ainda muitas pessoas infectadas no Brasil”, concluiu Palombo.
Na UFF, temos o SAE, que tem o objetivo de organizar as ações de Aids no Huap. Atualmente, o local conta com uma equipe multiprofissional nas áreas de cardiologia, clínica médica, pediatria, obstetrícia, enfermagem, serviço social, farmácia, psicologia, nutrição e odontologia.
Os serviços disponibilizados pelo setor incluem consultas individualizadas para pacientes que vêm sendo tratados no próprio hospital universitário e participação de grupos abertos à comunidade interessada. Além disso, o atendimento engloba o acompanhamento de gestantes soropositivas provenientes do ambulatório de pré-natal, crianças nascidas de mães soropositivas, porém não contaminadas, e crianças positivas, além de adultos.
Já de acordo com o coordenador do Setor de Doenças Sexualmente Transmissíveis (DST/UFF) e do Laboratório de Virologia do Departamento de Microbiologia e Parasitologia, professor Mauro Romero Leal Passos, a universidade vem nos últimos anos intensificando o acolhimento e o atendimento aos estudantes soropositivos. Como medida de prevenção, houve a vacinação de cerca de 900 alunas contra o HPV, outra IST que pode causar câncer de garganta nos homens e do colo do útero em mulheres, mas que não tem relação direta com os pacientes com Aids.
Na entrevista a seguir, Mauro Romero fala sobre a estratégia de prevenção às IST na universidade:
Qual o objetivo do setor de DST/UFF e quais as doenças pesquisadas?
O setor foi criado há 30 anos e tem a função de ser um pólo de ensino, pesquisa e extensão. Ensino porque tem o envolvimento de alunos de graduação (Liga de Infecções de Doenças Sexualmente Transmissíveis), também dos alunos do curso de especialização, além da pesquisa de vacinação contra HPV para alunos da UFF, até 21 anos, e também com meninos de comunidade do Morro de Estado, de 11 a 17 anos. O setor também realiza a “tipagem” de HPV nessa comunidade de adolescentes e homens, tanto na genital quanto na boca. As doenças mais pesquisadas são infecção por HPV e todas as IST (sífilis, gonorreia, infecções vaginais). Cerca de 800 pessoas foram atendidas pelo setor em 2017, mas o maior volume de atendimento está ligado ao HPV. Muitos desses atendimentos são de pacientes encaminhados pelas unidades municipais e estaduais de saúde.
Quais serviços são oferecidos pelo laboratório à comunidade interna e externa?
Exame do colo do útero (preventivo e conhecido como Papanicolaou), diagnosticando lesões do HPV, bem como testes rápidos para identificação no sangue, por meio de sorologia, de sífilis, HIV, hepatite B e C. Em parceria com a disciplina de Virologia, pesquisamos também a dosagem e a positividade da vacina contra o HPV que é oferecida aos nossos alunos.
Como a comunidade pode ter acesso a esse tipo de serviço? É realizado algum agendamento por telefone ou presencialmente? Quais dias de atendimento?
A rede do SUS de Niterói encaminha pacientes para o laboratório do Setor de Doenças Sexualmente Transmissíveis, localizado à Rua Professor Hernani Melo, 71, Ingá. Os atendimentos são diários (manhã até o início da tarde) e podem ser agendados pelo telefone: (21) 2629-2494.
Existe algum trabalho ou atividade em relação à prevenção de IST, como distribuição de preservativos, por exemplo?
Realizamos atividades de educação e saúde, explicando à população, em especial aos jovens, a importância do uso do preservativo. Recentemente realizamos a Marcha contra Sífilis e sua modalidade congênita, que, por iniciativa nossa, se tornou um dia nacional de combate à doença, por meio da criação da Lei 13.340, de 31 de março deste ano, do Deputado Federal Chico D’Angelo. Promovemos também ações em comunidades, como no Morro do Estado. Distribuímos camisinhas no campus do Valonguinho. Todas as cantinas, inclusive na entrada do Instituto Biomédico, instalamos caixas com preservativos, masculino e feminino. Realizamos em parceria com a Sociedade Brasileira de DST, em julho deste ano, o “HPV in Rio”, evento de conscientização sobre a enfermidade. Mantemos também há 30 anos a edição do Jornal Brasileiro de DST, que pode ser acessado em www.dst.uff.br
Para complementar o aprendizado na área, estudantes estão atuando no laboratório?
Alunos de graduação participam da Liga de Infecções Sexualmente Transmissíveis. Como a UFF é pioneira nisso, os alunos fazem estágio no laboratório nas áreas de especialização, mestrado e doutorado.
Quais são as IST mais comuns?
No serviço da UFF, as campeãs são HPV, infecções vaginais e uretrais e um volume razoável de sífilis.
Alguma ação específica do laboratório será desenvolvida no Dia Mundial de Luta Contra a Aids?
Durante toda a semana, a UFF vai disponibilizar teste rápido para alunos da UFF e comunidade geral, no Setor de DST no Valonguinho.
Houve algum aumento do índice de infectados com o vírus da Aids e demais IST no Brasil?
Há um recrudescimento da doença principalmente em adolescentes, que iniciam sua vida sexual sem a preocupação com o uso da camisinha. Isso também é verificado em pessoas acima de 45 anos, pois a partir dessa faixa etária podem surgir os primeiros sintomas do diabetes, que causa nos homens a impotência. Daí o uso indiscriminado de medicamentos contra a disfunção eréctil.
Que recomendação o senhor daria à população em relação à prevenção das IST?
Incentivar o diálogo em família. Certos temas que envolvem a sexualidade não podem continuar sendo tabu entre pais, filhos e familiares. Além disso, o uso de camisinha durante as relações sexuais, principalmente com parceria nova, é de vital importância. As pessoas ao iniciarem uma nova relação, devem procurar saber se o parceiro já se vacinou contra hepatite B, que também é uma IST. O Brasil disponibiliza vacina contra essa doença a toda população nas unidades de saúde. Os próprios profissionais da área de saúde têm que atentar para isso e procurar a vacina, inclusive, na UFF tem a vacina. A Hepatite C, que leva à infecção crônica, tem aumentado na população acima dos 50 anos.
Há outras orientações importantes?
É muito importante a vacinação contra HPV, a partir dos nove anos de idade. O governo disponibiliza a vacina para meninos e meninas, dos nove aos 26 anos. A partir dessa faixa etária, o aconselhável é buscar uma clínica e vacinar. E atenção aos sintomas: se a pessoa tiver uma ferida na região genital ou na boca, ela deve procurar uma unidade de saúde mais próxima de casa, pois pode ser um sinal de doença. Além disso, há também outros sintomas, como o corrimento ou infecção vaginal e as dores na relação sexual, tudo isso pode ser uma infecção sexualmente transmissível.