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Pesquisadora investiga a emissão de gases do efeito estufa na Amazônia e no Pantanal

Com experimentos realizados em campo e em laboratório, pesquisa do Instituto de Química da UFF avalia a variação de emissão de óxido nitroso nos dois biomas brasileiros

O impacto das ações humanas no meio ambiente tem influenciado cada vez mais as mudanças climáticas. No Brasil, cientistas avaliam as alterações que acontecem nos biomas nacionais, sobretudo na floresta amazônica, considerada a maior floresta tropical do mundo com cerca de 6,74 milhões de km2, estendendo-se por sete países além do Brasil e parte do território da Guiana Francesa. Dada a importância desse ecossistema, na pesquisa “Mecanismos de emissão de óxido nitroso (N2O) em áreas alagáveis de florestas tropicais: Modelagem de eventos extremos na Floresta Amazônica”, Gabriela Cugler, doutoranda do Programa de Pós-Graduação em Geociências (Geoquímica) da Universidade Federal Fluminense (UFF), estuda a emissão de óxido nitroso nos solos de áreas naturalmente alagáveis na Amazônia e no Pantanal.

De acordo com o último relatório da Convenção-Quadro da Organização das Nações Unidas sobre Mudança Climática (UNFCCC), a temperatura do planeta pode aumentar até 2,6ºC até o fim do século. Na Amazônia, a diminuição do nível de chuva nos períodos de estiagem, somada ao avanço do desmatamento, pode levar à ampliação da seca em algumas áreas, enquanto o aumento das chuvas em outras regiões da floresta pode provocar o alagamento de locais nunca antes alagados. Esses eventos são intensificados pelo efeito estufa, um fenômeno natural que possibilita a vida na Terra ao reter parte da radiação emitida pelo Sol pelos gases presentes na atmosfera, chamados de gases do efeito estufa (GEE). Entre eles, está o óxido nitroso (N2O), capaz de agravar a destruição da camada de ozônio e cuja principal forma de emissão, apontada até o momento, na Amazônia e no Pantanal, é pelo solo de áreas alagadas. Cugler explica que a agricultura e as indústrias são grandes fontes de produção do gás, mas que existe uma lacuna de informações ao tentar entender qual o impacto das emissões de N2O pelas florestas naturais. “Seja uma floresta tropical ou temperada, onde elas se encaixam dentro desse cenário?”, questiona.

A pesquisadora destaca a importância da floresta amazônica que, por mais que seja conhecida como “pulmão do mundo”, não tem como principal função a produção de oxigênio. Como Cugler ressalta, nas escolas é ensinado que as plantas consomem gás carbônico para a liberação de oxigênio no processo de fotossíntese. “A partir desse conhecimento, foram realizados estudos ao redor do mundo para entender melhor a participação das florestas nesse cenário (de controle de gases do efeito estufa), então já temos uma noção de que as florestas são importantes nesse contexto, mais ainda nas áreas tropicais por serem quentes. É importante considerar que o calor afeta muito o metabolismo dos microorganismos”. Ressaltando que os seres nessa faixa climática são bastante afetados pela alteração de temperatura, a pesquisadora observou que as florestas tropicais, em razão da temperatura, influenciam na produção de óxido de nitroso e começou a quantificar as taxas de emissão na Amazônia e no Pantanal, especificamente em ecossistemas alagáveis, regiões que passam de três a quatro meses sob influência da água.

O estudo destrincha como a produção de N2O funciona em diferentes cenários do bioma amazônico, considerando a presença ou não de água e de árvores, em quatro trabalhos: dois de campo, na Amazônia e no Pantanal, para avaliar o que acontece com o ambiente com o aumento ou diminuição do nível de água, e dois experimentos em laboratório apenas na Amazônia, buscando entender o impacto desses eventos extremos de seca ou alagamento. Na Floresta tropical, os experimentos têm sido realizados em parceria com o Instituto de Desenvolvimento Sustentável Mamirauá (IDSM) e financiado pelo conselho de pesquisa do governo Sueco (FORMAS), já os testes em laboratório foram realizados com apoio da Universidade de Lancaster, da Inglaterra, do IDSM e da Royal Society, também da Inglaterra. Em uma das experimentações somente com amostras de solo (microcosmo), foram realizadas alterações no teor de água do solo: “Secamos o solo para saber o que aconteceria com a emissão em caso de seca extrema. Depois, começamos a simular a chuva. Melhoramos esse experimento para entender esse processo de alagamento; para saber o que aconteceria com esses dados de emissão caso ele se estendesse por mais tempo que o comum”.


Coleta de N2O em árvore na floresta amazônica / Créditos: Acervo Pessoal

Em uma segunda testagem, também foram realizadas simulações de chuva, mas com amostras de solo contendo árvores jovens típicas dos biomas estudados (mesocosmo). “Simulamos como se as plantas estivessem em ambiente aberto, expostas à chuva, e adicionávamos mais água para observar o que aconteceria se aumentasse esse período chuvoso. Depois, também alagamos para saber como a planta lida com esse processo”. Esses experimentos serviram para avaliar não apenas a variação de emissão de N2O nos ecossistemas, como também em situações de mudanças projetadas no futuro.


Experimento com plantas jovens (mesocosmo) / Créditos: Acervo Pessoal

Viviane Figueiredo Souza, co-orientadora do estudo, acrescenta que existem realidades previstas de mudanças extremas na Amazônia, como áreas que se tornarão mais secas e regiões que podem passar a apresentar maior frequência de chuvas. A ideia do projeto é justamente avaliar essas realidades já estabelecidas pela produção científica, que abordam também o ponto de mudança da floresta em que ela não vai mais conseguir se recuperar e entrar em um novo estágio. “Com esses cenários, quisemos entender como o N2O, um gás de efeito estufa extremamente potente comparado ao dióxido de carbono (CO2) e ao metano (CH4), comporta-se diante dessas situações que vão afetar diretamente os processos microbiológicos, consequentemente afetando a produção dele no solo”. A pesquisadora reforça que a Amazônia já está passando por alterações e explica a importância da pesquisa de Cugler: “Ela pegou áreas que nunca foram secas e secou para ver como seria e também fez o contrário, alagou áreas que nunca foram alagadas e que não tem previsão de serem alagadas naturalmente, porque são áreas de florestas mais altas”.


Coleta de N2O em solo da Amazônia / Créditos: Acervo Pessoal

No Pantanal, foi realizado o trabalho de campo apenas na fase seca, com parceria da Universidade de Linkoping, da Suécia. A simulação resultou em uma taxa de emissão de óxido nitroso pequena, porém significativa, quando considerado que a fase seca do Pantanal pode aumentar. Figueiredo explica que para haver um pico de produção de N2O, é preciso que exista entre 60% e 80% de teor de água no solo, ou seja, ele precisa estar encharcado. Até o momento, “os experimentos de simulação foram bem relevantes, no de microcosmo, em que trabalhamos só com solo, conseguimos ver essa influência da água claramente. No período seco, as taxas de emissão são mais baixas e contínuas, quando adicionamos água, dependendo do quanto aquele solo já estava encharcado, conseguimos ver um pico de emissão de N2O”, complementa.


Amostras coletadas para realização do experimento de microcosmo na Amazônia / Créditos: Acervo Pessoal

A pesquisa ainda está em andamento, os próximos passos do estudo são avaliar o papel das estruturas das plantas na produção do gás do efeito estufa e como essa emissão acontece considerando a adição de fertilizantes no solo, como ocorre com a expansão da agricultura no bioma amazônico, e não apenas com o ambiente natural.

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Gabriela Cugler de Pontes é bacharel em Ciências Ambientais, formada em 2017 e mestre em Geociências (Geoquímica), formada em 2019, ambas pela Universidade Federal Fluminense. Atualmente, realiza pesquisa de doutorado pelo Programa de Pós-Graduação em Geociências (Geoquímica) na Universidade Federal Fluminense, com auxílio da bolsa FAPERJ, sobre o tema de avaliação de ciclos biogeoquímicos e produção e emissão de gases de efeito estufa em ambientes alagáveis tropicais florestais.

Alex Enrich Prast é graduado em Biologia (Bacharelado em Ecologia, 1995), com mestrado (1998) e doutorado (2001) em Ecologia pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). Realizou seu doutorado sanduíche na Universidade de Aarhus (Dinamarca) entre 1999 e 2000. Desenvolveu pós-doutoramento no Max-Planck Institute of Terrestrial Microbiology (Alemanha) entre 2003 e 2006. Foi Editor Chefe do periódico Oecologia Australis de 2006 a 2013. É membro do Biogas Solutions Research Center da Universidade de Linköping (Suécia).

Viviane Figueiredo Souza é formada em Ciências Biológicas, bacharelado em Ecologia, desde 2009, na Universidade Federal do Rio de Janeiro. Concluiu, em 2012, o Mestrado Acadêmico em Ecologia pelo Programa de Pós-Graduação em Ecologia da Universidade Federal do Rio de Janeiro e o Doutorado Acadêmico, em 2017, em Geociências – Geoquímica Ambiental pelo Programa de Pós-Graduação em Geociências na Universidade Federal Fluminense, fazendo parte do Laboratório de Biogeoquímica da UFRJ. Atualmente, realiza sua pesquisa de Pós-doutorado com enfoque em ciclos biogeoquímicos e produção e emissão de gases de efeito estufa em ambientes tropicais florestais (Amazônia, Pantanal e Mata Atlântica).

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