Conhecer a legislação e acompanhar a implementação de políticas públicas são requisitos importantes para que se possa cobrar pela garantia de direitos. Motivada por essa questão, a Universidade Federal Fluminense (UFF) publicou, através da editora Hypatia, a série de livros “Planos Municipais de Educação do Rio de Janeiro: Análise Comparativa da Meta IV do Plano Nacional de Educação”. A finalidade das obras é comparar a Meta IV, sobre a Educação Especial, do Plano Nacional de Educação (PNE), com o que consta nos Planos Municipais de Educação (PME) do estado do Rio de Janeiro.
O Plano Nacional de Educação (PNE; Lei 13.005/2014) é um documento que abrange o período de dez anos e orienta a educação brasileira. Ele determina as diretrizes que devem direcionar a educação do país, estabelece metas a serem cumpridas durante a vigência da lei e define responsabilidades partilhadas entre a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios. Neste documento, a Meta IV aborda as estratégias para o público da Educação Especial. Ela universaliza o acesso à educação básica e ao atendimento educacional especializado, preferencialmente na rede regular de ensino, para indivíduos de quatro a 17 anos com deficiência, transtornos globais do desenvolvimento e altas habilidades ou superdotação.
Por ser um documento base para a educação brasileira, o PNE foi debatido em conferências pelo Brasil, originando outras leis que regem a educação em diferentes níveis, como os Planos Municipais de Educação (PME). Cada município elaborou um documento norteador com a finalidade de definir propostas para a educação em nível municipal. Como compreender a legislação é fundamental para o exercício da profissão, a série de livros “Planos Municipais de Educação do Rio de Janeiro: Análise Comparativa da Meta IV do Plano Nacional de Educação” reúne reflexões sobre a avaliação da Meta IV nos planos dos municípios do estado do Rio de Janeiro.
Os dois volumes publicados foram coordenados pelas docentes Edicléa Mascarenhas e Cristina Delou. A primeira é professora da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ), do Mestrado Profissional em Diversidade e Inclusão (CMPDI) e do Doutorado em Ciências, Tecnologia e Inclusão (PGCTIN) da UFF. A segunda, docente aposentada dos programas de pós-graduação citados anteriormente. De acordo com Edicléa Mascarenhas, o convite para ministrar a disciplina “Bases Legais”, na pós-graduação, surgiu como uma imensa oportunidade. “Quando Delou me convidou, sugeri trabalharmos com a avaliação da Meta IV nos Planos Municipais de Educação (PME) do estado do Rio de Janeiro. Assim, comparamos a Meta IV, que trata especificamente da Educação Especial, do Plano Nacional de Educação (PNE) com as fontes documentais dos municípios”, comenta Mascarenhas.
Os livros reúnem artigos científicos de discentes da disciplina “Bases Legais”, ofertada nos cursos de mestrado e doutorado da universidade. Os volumes englobam o estudo da Meta IV de quarenta e cinco municípios do estado do Rio de Janeiro. De acordo com Edicléa Mascarenhas, os alunos iniciaram o trabalho pelo estudo da lei, que deve ser conhecida, reconhecida, interpretada e atualizada. “Nós fizemos um traçado inicial para o aluno perceber e analisar a evolução da legislação sobre Educação Especial no Brasil, inclusive dos conceitos. Por exemplo, leis mais antigas trabalham com o termo ‘excepcional’, depois ‘alunos com necessidades especiais’ e, atualmente, ‘público da Educação Especial’. Logo, é necessário perceber que os discursos têm uma perspectiva de como se compreende esse público em determinado momento”, revela Mascarenhas.
Posteriormente, os discentes se debruçaram sobre o plano dos municípios escolhidos para análise, através da pesquisa em fontes documentais. Nesse momento, eles compararam a Meta IV dos planos municipais com o que está estabelecido no PNE. “Os alunos escolheram o município e descobriram a lei. Eles fizeram o levantamento nos sites das prefeituras, verificaram os decretos e analisaram fontes do IBGE. Depois, construíram quadros comparativos entre o PNE e as fontes documentais dos municípios, ou seja, os Planos Municipais de Educação (PME). Em alguns casos, notaram que existe um certo avanço em determinados municípios em relação à política nacional”, ressalta Mascarenhas.
Na última etapa, os estudantes apresentaram o trabalho para seus orientadores, para que eles pudessem ler, avaliar, fazer as críticas necessárias e concordar em entrar na publicação científica. O livro é produzido com o apoio social da editora Hypatia e está disponível com audiodescrição, sendo acessível para as pessoas cegas. Além disso, o material está sendo disseminado pelos conselheiros municipais. Logo, aqueles que possuem o município pesquisado podem identificar como a Meta IV foi analisada pela universidade. Os demais terão as bases de como investigar e analisar os princípios da Educação Especial que estão sendo aplicados nas suas cidades. “É esse desdobramento que fascina. Nós levarmos as nossas produções não só para o campo acadêmico, mas também como uma perspectiva a ser utilizada pelos conselheiros, pessoas com deficiência e legisladores”, destaca Mascarenhas.
O Mestrado Profissional em Diversidade e Inclusão (CMPDI) da UFF não faz da universidade somente um lugar que concebe teoricamente a inclusão, mas a trata como algo no interior da instituição. O programa possui alunos que são público da Educação Especial, conta com docentes com deficiência e já formou mestres surdos. Nesse sentido, como destaca Edicléa Mascarenhas, é importante ressaltar a necessidade de abandonar a perspectiva de que as pessoas com deficiência ou com altas habilidades e superdotação sejam só produtos do fazer teórico acadêmico e não professores e pesquisadores no campo.
A professora Suelen Marques, coordenadora do Programa de Mestrado Profissional em Diversidade e Inclusão (CMPDI) da universidade, destaca que o curso capacita múltiplos profissionais, muitos deles professores que atuam na escola realizando o atendimento e a inclusão. Sendo assim, há uma discussão e construção a partir de uma visão multi-transdisciplinar que enriquece a análise da legislação. Além disso, há um ganho do programa em termos de impacto na sociedade. “O livro é uma das ferramentas que trazemos para que o agente prático da inclusão possa ser um agente que reflete, se apropria de teóricos e dos processos da discussão para que a inclusão seja contextualizada. Assim, temos esse ganho: o professor agente da inclusão agora possui a capacidade de questionar a prática, atuar com uma prática melhor e fazer a orientação familiar para a condução dos seus direitos e deveres”, finaliza.
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Edicléa Mascarenhas Fernandes é professora Associada da Universidade do Estado do Rio de Janeiro. Coordenadora do Núcleo de Educação Especial e Inclusiva e Líder do Grupo de Pesquisa do CNPQ Produção de Materiais Didáticos Acessíveis para Alunos com Deficiências em Contextos Formais e Informais de Educação. Doutora em Ciências pela FIOCRUZ, Mestre em Educação pela UERJ, Psicóloga pela UFRJ e Pedagoga pela UNIGRANRIO. Professora Permanente do Programa de Pós Graduação em Educação, Cultura e Comunicação em Periferias Urbanas, FEBF/UERJ do Mestrado em Diversidade e Inclusão e Doutorado em Ciências, Tecnologia e Inclusão da Universidade Federal Fluminense. Coordenadora da disciplina de Educação Especial da Fundação Centro de Ciências e Educação Superior à Distância do RJ, onde é membro da Comissão para Estudos e Propostas para Alunos com Necessidades Especiais.
Suelen Adriani Marques é professora associada na Universidade Federal Fluminense, Coordenadora do Curso de Mestrado Profissional em Diversidade e Inclusão (CMPDI/UFF), e Coordenadora da Plataforma de Microscopia Eletrônica do Instituto de Biologia (PMEIB/UFF). Bacharel em Fisioterapia, pós-graduada em Docência de Nível Superior, mestrado e doutorado em Ciências Morfológicas (PCM- UFRJ), com ênfase em Neurociências. Professora de Neurociências da UFF desde 2009 e membro do corpo permanente do Programa de pós-graduação em Anatomia Patológica (PPGAP/UFRJ). Estuda as consequências da lesão do sistema nervoso, com foco na recuperação funcional e regeneração nervosa após lesão central e periférica; o emprego das Práticas Integrativas e Complementares em Saúde (PICS) nas disfunções do sistema nervoso e na saúde mental e bem-estar; além de investigar questões voltadas à inclusão e ensino.