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UFF Responde: Doenças Respiratórias

Professores da UFF comentam os impactos da chegada do inverno no aumento da ocorrência doenças respiratórias

Gripe, vírus sincicial, COVID-19 e influenza são exemplos de algumas das doenças respiratórias agudas mais encontradas no Brasil e no mundo. Além das agudas, outras doenças respiratórias, as crônicas, também se tornam protagonistas com a chegada do inverno. Segundo o Ministério da Saúde, as mais comuns no Brasil são: rinite, asma, sinusite que, em temperaturas frias, também tendem a se fazer mais presentes, causando coriza e outros sintomas.

De acordo com uma pesquisa publicada no The Journal of Allergy and Clinical Immunology, as reduções de temperatura afetam as células do nariz. O estudo aponta que uma queda na temperatura de apenas 5ºC já mata quase 50% dos bilhões de células e vírus úteis no combate a bactérias nas narinas.

No Brasil, informações do InfoGripe, boletim divulgado pela Fiocruz em maio, apontam que há uma crescente nas internações por Síndrome Respiratória Aguda (SRAG). De acordo com o relatório, 27,6% dos testes para doenças respiratórias foram positivos para influenza A, 56,8% para vírus sincicial respiratório (56,8%) e 5,1% para Covid-19. Além das internações, as mortes também são um fator de alerta. Em abril deste ano, a Agência Brasil publicou que o total de óbitos em 2024 pela Síndrome Respiratória Aguda, até aquele momento era de 2.333 casos.

Para falar sobre os impactos das doenças respiratórias nesta chegada do inverno, convidamos os professores André Ricardo Araújo e Cyro Teixeira, da Faculdade de Medicina da Universidade Federal Fluminense (UFF):

O que são doenças respiratórias?

CYRO: São doenças que afetam componentes do sistema respiratório, como boca, nariz, laringe, faringe, seios da face, traqueia, pleuras e pulmões. Essas doenças podem ocorrer em todas as faixas etárias, apresentando características clínicas e imagéticas diferentes, além de perfis de tratamento específicos. Suas causas são variadas, incluindo infecções, frio e umidade do ar, tabagismo e outras drogas, fatores hereditários, entre outros.

Quais são as doenças respiratórias mais comuns?

CYRO: As principais doenças respiratórias incluem gripes, resfriados, rinossinusite, COVID-19, asma, bronquites agudas, DPOC (bronquite crônica e enfisema pulmonar), tuberculose, câncer pulmonar primário ou secundário (metástases de diversos órgãos), bronquiectasias, fibroses, doenças ocupacionais, doenças reumáticas, pneumonias, trombose venosa profunda, síndrome do derrame pleural, tabagismo e pneumonias de hipersensibilidade (PH). No Brasil, existem mais de 350 causas de PH, sendo as mais prevalentes mofo domiciliar ou no trabalho, exposição a pássaros (como pombos, periquitos e papagaios), substâncias químicas liberadas durante a produção de plásticos e produtos eletrônicos, e bactérias presentes em banheiras de hidromassagem, piscinas e chuveiros. Essas doenças podem apresentar sintomas como dispneia (falta de ar), sibilos (chiado no peito), tosse seca ou produtiva (com expectoração de catarro), pigarro, dor torácica, rouquidão, constipação nasal e desconforto auditivo, entre outros, muitas vezes associados a comorbidades.

Quais os efeitos das doenças respiratórias em crianças e em idosos? Eles podem ser considerados mais vulneráveis a esses problemas?

ANDRÉ: Os extremos da vida são considerados mais vulneráveis às doenças respiratórias. As crianças, em particular, são uma população vulnerável devido ao fato de ainda não terem seu sistema imunológico completamente desenvolvido. Elas geralmente têm muito contato entre si, trocando secreções em creches, parques, chupetas e copos de bebê. Essa interação é uma parte importante do desenvolvimento imunológico, especialmente em crianças menores de quatro ou cinco anos, e mais especificamente em lactentes com menos de seis meses de idade.
Por outro lado, os idosos também são vulneráveis devido à sua exposição ao longo da vida a diversos agentes patogênicos, além de apresentarem um sistema imunológico enfraquecido em comparação com adultos mais jovens. Essa vulnerabilidade os torna suscetíveis a doenças respiratórias, como observado durante a pandemia de COVID-19 e a anterior pandemia de H1N1, onde essas populações foram particularmente afetadas.

Em certos períodos do ano, como no outono e inverno, as doenças respiratórias se tornam mais frequentes. Por que isso acontece?

ANDRÉ: Habitualmente, duas situações contribuem para a circulação de vírus respiratórios: a biologia dos vírus, que tendem a se espalhar no outono e início do inverno, e a tendência das pessoas a permanecerem em ambientes fechados durante períodos de frio intenso, o que é mais comum em locais com climas mais frios do que no Brasil. Essa permanência em ambientes sem circulação de ar favorece aglomerações, facilitando a transmissão de vírus por secreções respiratórias ou por contato com secreções em superfícies. Para prevenir essa circulação, recomenda-se manter os ambientes arejados, mesmo em épocas mais frias, e adotar o hábito de higienizar as mãos sempre que houver contato com ambientes desconhecidos ou secreções respiratórias.

Algumas doenças respiratórias podem ter sintomas parecidos, como podemos diferenciá-las?

CYRO: A diferenciação dos sintomas ocorre por meio de uma anamnese bem conduzida em que o médico precisa de tempo para escutar e questionar o paciente ou seu acompanhante. Informações como idade, índice de massa corporal, profissão, animais domésticos, higiene no lar, intolerância a medicamentos, histórico de tabagismo ativo ou passivo, uso de drogas, ambiente de residência ou trabalho, estilos de vida, hábitos alimentares, prática de exercícios físicos e distúrbios do sistema nervoso central são essenciais. Além disso, o exame físico dos pulmões e outros órgãos, bem como exames de imagem, são cruciais.
A tomografia computadorizada (TC) do tórax é especialmente importante hoje em dia, pois revela achados que a radiografia de tórax não consegue detectar. Endoscopias respiratórias (como faringo-laringoscopia, rinosinusoscopia, broncoscopia, pleuroscopia, toracoscopia e mediastinoscopia), exames de sangue e provas de função pulmonar (PFP) complementam o diagnóstico. Os exames de PFP mais simples, baratos e não invasivos são a oximetria de pulso e a espirometria. A espirometria avalia a função ventilatória dos pulmões em grandes e pequenas vias aéreas, sendo especialmente útil para doenças com perfil obstrutivo da respiração, como DPOC, asma, rinossinusite, tabagismo e bronquiectasias.

Qual a relação entre a poluição do ar e as doenças respiratórias?

ANDRÉ: As doenças respiratórias, incluindo aquelas relacionadas a ambientes ocupacionais, estão diretamente ligadas à poluição e à qualidade do ar, bem como à exposição a materiais orgânicos suspensos no ambiente de trabalho. A inalação frequente desses materiais pode levar a condições como a silicose, uma forma de pneumonia química resultante dessa exposição ocupacional. Além disso, o tabagismo, tanto convencional quanto eletrônico, é conhecido por causar doenças pulmonares crônicas, como enfisema pulmonar e bronquite crônica, além do câncer de pulmão.
Recentemente, o uso de cigarros eletrônicos foi associado a uma condição pulmonar inflamatória tratável, conhecida como EVALI, que tem sido diagnosticada em adultos e jovens. A falta de conhecimento sobre as substâncias presentes no vapor dos cigarros eletrônicos contribui para a emergência dessa nova condição. Essas informações destacam a importância de evitar a exposição a fatores de risco ambientais e comportamentais para prevenir doenças respiratórias.

Qual a diferença entre doença respiratória aguda e doença respiratória crônica? Além disso, sabe-se que uma doença respiratória crônica pode ser herdada geneticamente, mas essa doença pode se desenvolver sem que haja predisposição genética?

CYRO: Doenças agudas se desenvolvem repentinamente e duram pouco tempo, geralmente apenas alguns dias ou semanas. Condições crônicas se desenvolvem lentamente e podem piorar ao longo de um longo período de meses a anos. Doenças respiratórias agudas geralmente são causadas por infecções, intolerância ao tempo ou poluentes inalatórios. Doenças respiratórias crônicas são frequentemente causadas por comportamentos não saudáveis ​​que aumentam o risco de doenças como, por exemplo, má nutrição, atividade física inadequada e vício de drogas. Fatores sociais, emocionais, ambientais e genéticos também são importantes.
À medida que as pessoas envelhecem a partir dos 25 anos de idade, elas são mais propensas a desenvolver uma ou mais doenças crônicas, respiratórias ou não respiratórias. De acordo com a pesquisa da National Council on Aging (2024), quase 95% dos adultos com 60 anos ou mais têm pelo menos uma doença crônica, enquanto quase 80% têm duas ou mais. As principais doenças crônicas pulmonares são DPOC, bronquiectasias, doenças ocupacionais, fibroses de diversas causas ou idiopáticas, entre outras.
Quanto à segunda pergunta, sim, a influência genética é um fator importante em algumas doenças respiratórias, como a asma, fibrose cística e enfisema pulmonar por deficiência de alfa-1-antitripsina.

Uma doença respiratória aguda pode evoluir para uma doença respiratória crônica? Como isso acontece?

CYRO: Sim. O tabagismo, por exemplo, é um importante fator de risco para o desenvolvimento da Doença Pulmonar Obstrutiva Crônica (DPOC). O enfisema pulmonar, uma das manifestações da DPOC, pode se desenvolver devido ao tabagismo, mesmo na ausência de predisposição genética direta.

ANDRÉ: Certas condições também podem atuar como gatilhos para doenças respiratórias crônicas. O vírus sincicial respiratório (VSR), que causa bronquiolite em crianças, por exemplo, pode estar relacionado ao desenvolvimento futuro de asma brônquica. Existe, portanto, uma conexão entre essas condições em alguns casos. No entanto, apenas o acompanhamento médico adequado pode identificar e direcionar o tratamento nessas situações.

O vírus sincicial (VSR) é uma doença respiratória aguda e um vírus sazonal, mas, dependendo da região do Brasil, ele aparece em temporadas diferentes. Por que essa diferença acontece?

ANDRÉ: O Brasil, sendo um país continental, apresenta diferentes padrões de sazonalidade devido à sua vasta extensão territorial. Habitualmente, o vírus sincicial e outros vírus respiratórios circulam de forma mais intensa no hemisfério norte durante o outono e o inverno. Consequentemente, a região norte do Brasil experimenta um aumento na circulação desses vírus próximo aos meses de novembro, dezembro e janeiro, coincidentes com o inverno do hemisfério norte. Em contraste, parte da região do nordeste, as regiões centro-oeste, sudeste e sul tendem a seguir o padrão de circulação do hemisfério sul, com maior incidência entre os meses de maio e agosto.

O vírus sincicial tem se manifestado mais em crianças de até 2 anos, por quê?

ANDRÉ: Alguns vírus têm predileção por determinadas faixas etárias, e o vírus sincicial respiratório é um exemplo, afetando principalmente crianças menores de dois anos, especialmente aquelas com menos de seis meses. Embora possa circular em outras populações, muitas vezes passa despercebido em adultos, mas pode causar sintomas mais fortes em idosos.

A Anvisa aprovou, em abril, uma vacina contra VSR para ser aplicada em gestantes e imunizar os bebês. Antes, a Agência havia aprovado um imunizante para pessoas idosas. Como funcionam essas vacinas? Quando estarão disponíveis?

ANDRÉ: Atualmente, temos duas vacinas aprovadas contra o Vírus Sincicial Respiratório (VSR), embora ainda não estejam disponíveis no sistema público de saúde. Essas vacinas foram desenvolvidas devido à alta prevalência do VSR em bebês e idosos, que pode levar a casos graves de bronquiolite, uma doença respiratória sintomática que pode resultar em hospitalização e até óbito.
A vacina da Pfizer, aprovada para gestantes, visa reduzir os casos graves de bronquiolite nos primeiros seis meses de vida dos bebês, causados especificamente pelo VSR. Esta imunização pode ser administrada em gestantes durante o segundo e terceiro trimestres de gravidez e em idosos acima de 60 anos.
Além disso, a indústria farmacêutica está pesquisando vacinas específicas para a população pediátrica, visando um efeito direto. Atualmente, as vacinas administradas em gestantes transferem imunidade ao bebê, proporcionando proteção nos primeiros seis meses de vida. Entre as vacinas em desenvolvimento, há uma intranasal contra o VSR que está em fase inicial. Espera-se que, nos próximos anos, esta vacina esteja disponível para a população pediátrica.

Qual o papel das vacinas na prevenção e combate às doenças respiratórias?

ANDRÉ: As vacinas combatem inúmeros agentes causadores de infecções respiratórias. Embora o foco seja frequentemente no calendário vacinal infantil, é importante ressaltar que o Ministério da Saúde estabelece calendários vacinais para todas as faixas etárias, incluindo adolescentes, gestantes, adultos e idosos.
O Programa Nacional de Imunização (PNI) oferece a vacina pneumocócica, que previne contra a bactéria pneumococo, causadora de pneumonia. Outra vacina disponível na rede pública é contra a bactéria Haemophilus influenzae, que pode causar doenças como meningite e infecções respiratórias graves. Além disso, a vacina BCG protege contra formas graves de tuberculose.
Essas vacinas são ferramentas consagradas, já disponibilizadas à população, garantindo eficiência e ampla aplicabilidade. O objetivo é proteger o maior número possível de pessoas contra esses graves agravos de saúde, portanto, estimular o conhecimento sobre a disponibilidade dessas vacinas é crucial.

Além da vacinação, quais outros cuidados são necessários para evitar as doenças respiratórias?

ANDRÉ: As medidas de prevenção são essenciais e muitas vezes desconhecidas pela população em geral. Além da vacinação, manter o hábito de higienizar as mãos com água e sabão após o contato com secreções respiratórias e em ambientes de grande aglomeração é fundamental. Mesmo durante o inverno, é importante manter as janelas abertas para garantir a circulação de ar. Em ambientes hospitalares, profissionais de saúde podem receber recomendações específicas, incluindo o uso de máscaras de acordo com o tipo de contato e doença do paciente. Essas medidas são essenciais para prevenir a propagação de doenças em diversas situações e ambientes.

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Cyro Teixeira da Silva Junior é médico e professor titular de Pneumologia da Faculdade de Medicina da Universidade Federal Fluminense, mestre em Medicina (Pneumologia) pela Universidade Federal Fluminense (1987) e doutor em Medicina Pneumologia pela Universidade Federal Fluminense (2000). Possui um segundo doutorado em Ciências Biológicas (área de Neuroimunologia) pela Universidade Federal Fluminense (2008). Orienta e orientou alunos de mestrado e doutorado nos Programas de Pós-Graduação (CAPES) em Neurociências, Saúde Materno-Infantil, Ciências Médicas da UFF e Ciências Médicas da Santa Casa de São Paulo. Colaborador dos Programas de Pós-Graduação Strictu Sensu da Faculdade de Medicina de Jundiaí (SP)* Especialista em Pneumologia com RQE pela AMB/SBPT/CREMERJ. Responsável pelo Laboratório de Pesquisa em Líquido Pleural do Instituto de Biologia da UFF. Em dezembro de 2014 foi responsável pela organização do I Encontro Nacional de Pleurologia, Líquido Pleural e Doenças Causais (Pleura in Rio 2014) pela SOPTERJ, com apoio institucional da SBPT/AMB e CREMERJ. Coordenador dos Programas de Pós-Graduação Lato Sensu em Pneumologia da UFF. Atualmente é responsável pelo Laboratório de Provas de Função Pulmonar do Centro de Investigação da Tuberculose e outras Doenças Pulmonares Prof. Mazzini Bueno, vinculado à Faculdade de Medicina da UFF.

André Ricardo Araújo da Silva é médico pela Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro (1998), mestre em Medicina (Doenças Infecciosas e Parasitárias) pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (2006) e doutor em Pesquisa Clinica em Doenças Infecciosas pela Fundação Oswaldo Cruz (2010). Pós-Doutorado na Ludwig-Maximilians-Universität München (2018/9)- financiamento CAPES. Professor associado da Universidade Federal Fluminense. Membro permanente do corpo docente do Mestrado Profissional em Saúde Materno-Infantil da UFF. Membro da Federação Internacional de Controle de Infecção (IFIC).Membro colaborador da OMS para a atualização das diretrizes de manejo clínico e tratamento da COVID, da INFLUENZA e manejo da MIS-C pediátrica. Tem experiência na área de Medicina, com ênfase em Medicina, atuando principalmente nos seguintes temas: gestão de antimicrobianos, prevenção e controle de infecções relacionadas à assistência à saúde em neonatologia e pediatria, ensino médico, multirresistência antimicrobiana, COVID-19, vírus respiratórios.

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