Em março de 2020, a pandemia de COVID-19 suspendia as atividades presenciais da maioria das instituições ao redor do mundo, inclusive das universidades. Diante deste cenário, os indivíduos foram convocados a criar novas formas de interação social em um contexto de isolamento físico, com exceção daqueles envolvidos em atividades consideradas essenciais. A fim de enriquecer essa discussão, a Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES), fundação do Ministério da Educação (MEC), desenvolveu o “Programa de Desenvolvimento da Pós-Graduação (PDPG) – Impactos da pandemia”, cuja finalidade é incentivar a formação de recursos humanos com foco nos estudos sobre os impactos sociais, econômicos, culturais e históricos da crise sanitária causada pelo coronavírus nos diversos segmentos da população –
A pandemia também evidenciou a vulnerabilidade social, econômica e tecnológica dos estudantes, que tiveram muita dificuldade em desenvolver trabalhos que exigiam computadores e softwares mais sofisticados, já que os laboratórios das universidades não estavam funcionando. Os projetos universitários anteriores pressupunham contato e presença no espaço da universidade. Porém, mesmo no contexto pandêmico, observamos o desejo dos estudantes de participarem de atividades coletivas, ainda que de forma remota – India Mara Martins
Um dos três projetos da Universidade Federal Fluminense (UFF) selecionados pela CAPES para o PDPG – Impactos da pandemia é intitulado “Legado pandêmico: plataformas audiovisuais viabilizam projetos remotos”, que visa estabelecer e implementar tecnologias facilitadoras para a área de audiovisual. O projeto é coordenado pelas professoras Índia Mara Martins e Elianne Ivo Barroso, ambas do Departamento de Cinema e Audiovisual da UFF, e tem como questões fundamentais o acesso e a inclusão da comunidade externa à universidade pública a partir dos debates sobre práticas a distância que surgiram do contexto pandêmico. “A proposta selecionada pela CAPES consiste em implementar essas tecnologias facilitadoras criadas na UFF, nos cursos de cinema e audiovisual da Universidade Federal do Recôncavo da Bahia (UFRB) e Universidade Federal do Pará (UFPA) ”, pontua Índia Mara.
Durante a pandemia, a universidade foi confrontada com a urgência das atividades remotas, sendo necessário pensar em alternativas para esse cenário. Passados dois anos da crise sanitária gerada pela COVID-19, a universidade foi amplamente transformada por esse processo. De acordo com a pesquisadora, o principal problema observado no período da pandemia foi o isolamento das áreas de conhecimento e o trabalho remoto colaborou grandemente para isso. “A pandemia também evidenciou a vulnerabilidade social, econômica e tecnológica dos estudantes, que tiveram muita dificuldade em desenvolver trabalhos que exigiam computadores e softwares mais sofisticados, já que os laboratórios das universidades não estavam funcionando. Os projetos universitários anteriores pressupunham contato e presença no espaço da universidade. Porém, mesmo no contexto pandêmico, observamos o desejo dos estudantes de participarem de atividades coletivas, ainda que de forma remota”.
Foi necessário começar a pensar em maneiras de retomar este contato através das plataformas digitais. “Logo percebemos que não estávamos aproveitando todo o potencial das ferramentas, seja no ensino, na extensão ou até mesmo na pesquisa. Faltava um projeto que unisse o tripé da universidade pública: ensino, pesquisa e extensão e gerasse o desejo de participação dos estudantes isolados em suas residências. Em contato com colegas de outras instituições, observamos que as dificuldades eram semelhantes, e no caso da questão de acesso dos alunos à infraestrutura tecnológica, o problema era ainda mais grave. A partir dessas constatações e da necessidade de adaptação dos nossos projetos de extensão, iniciamos diálogos com parceiros dentro da UFF”, conta Índia Mara.
Com foco nessa realidade, a docente explica que surgem, a partir da Araci Incubadora de Projetos de Cinema e Audiovisual da UFF, criada pelo Departamento de Cinema e Vídeo e pela Superintendência de Tecnologia e Informação (STI), tecnologias audiovisuais viabilizadoras de projetos remotos. A incubadora vem desenvolvendo três projetos pilotos que têm em seu cerne atividades remotas, as quais podem projetar a universidade para um novo momento. “O aplicativo Araci.lab conta com um banco de talentos que visa estabelecer uma relação entre os estudantes de cinema e o mundo do trabalho. Já o projeto Tessitura consiste na criação de uma ilha de edição remota que visa possibilitar um ensino mais inclusivo, estruturando-se a partir de um servidor central. Por fim, temos o Observatório de Cinema e Audiovisual (OCA-UFF), que divulga pesquisas do Programa de Pós-Graduação em Cinema (PPGCINE-UFF) e possibilita o acesso a informações sobre a produção audiovisual, garantindo um conteúdo qualificado e estreitando os laços com a comunidade”, descreve Índia Mara.
Segundo a pesquisadora, a pandemia intensificou a cultura digital em razão do confinamento compulsório e abriu frente para uma nova relação com os registros audiovisuais. “A criação do Araci.lab visa, por um lado, dar visibilidade a esta série de gravações realizadas durante a pandemia, organizando o material por grupos específicos e de rápido acesso ao usuário. Por outro lado, antes da pandemia, muitos outros eventos também foram filmados e nunca ganharam divulgação. O Araci.lab, disponível para download nas lojas de aplicativos dos smartphones, também poderá abrigar conteúdos mais antigos, permitindo uma memória das atividades extracurriculares dos cursos. A ideia geral é organizar o máximo de conteúdo audiovisual produzido pelos cursos de Cinema e Audiovisual e, ao mesmo tempo, possibilitar uma consulta rápida e de fácil acesso por meio móvel”.
O contexto pandêmico também motivou docentes e discentes a repensar a sala de aula, buscando superar as dificuldades impostas pelo confinamento e adotar de forma inventiva o ensino remoto. “A crise sanitária reafirmou a internet como ferramenta mediadora das relações humanas e também do homem com as máquinas. Neste sentido, a ilha de edição virtual vem atender a várias necessidades dos Cursos de Cinema e Audiovisual. Primeiramente porque uma ilha de edição remota vai permitir o acesso a um equipamento de alta performance para mais de 400 estudantes de graduação, sem contar os pós-graduandos do PPGCINE, que poderão trabalhar a distância em seus projetos”, pontua a docente .
No caso do Observatório de Cinema e Audiovisual (OCA-UFF), pretende-se trabalhar com a divulgação de pesquisas e ações junto às comunidades interna e externa da UFF, bem como observar as notícias que circulam em torno do audiovisual. “O Observatório de Cinema e Audiovisual pretende ser conhecido também por sua sigla OCA-UFF. ‘Oca’ é uma palavra indígena, que tem sua origem na família linguística tupi-guarani. As ocas são construídas coletivamente e esta é uma ideia central do OCA-UFF: ter a colaboração da comunidade acadêmica e também da sociedade. Seu diferencial está em valorizar as produções audiovisuais não hegemônicas, mas também lançar outros olhares para a produção comercial, a partir de uma perspectiva teórico-crítica”, explica a coordenadora do projeto.
Para a professora, o período pandêmico e seus efeitos ressaltam a importância da tecnologia e também de não perdermos de vista as soluções encontradas durante esse momento, em diferentes áreas de conhecimento. “Com a seleção no edital da CAPES ‘PDPG – Impactos da pandemia’, será possível ampliar a equipe que participa dos projetos com bolsistas de pós-graduação, além de iniciar uma rede de pesquisa teórica e aplicada com os programas de pós-graduação de Artes, da UFRB, e de comunicação, da UFPA, universidades parceiras no edital. Por outro lado, contribuímos com a regionalização da pesquisa e o desenvolvimento dos PPGs fora do eixo Rio-São Paulo, enquanto as universidades parceiras colaboram para a ampliação do nosso conhecimento sobre a pesquisa realizada em cinema e audiovisual no Brasil”, conclui.