Das corridas de carruagem no Império Romano aos espetáculos mega produzidos do Cirque du Soleil, as artes circenses evoluíram ao longo do tempo, preservando o fascínio provocado em seus espectadores. Enquanto parte da cultura popular, o circo auxiliou no surgimento do Movimento Ginástico Europeu durante o século XIX — mais focado na saúde do trabalhador que sofria com as consequências da Revolução Industrial do que no usual entretenimento —, e posteriormente formulou e sistematizou a Ginástica, prezando pela rigidez e técnica nas performances corporais.
A adesão de práticas circenses em atividades escolares ainda acontece gradativamente, pois faltam profissionais que articulem as duas áreas. Entretanto, a iniciativa Prax-Circense de professores do Instituto de Educação Física e da Faculdade de Educação direciona essa demanda para uma proposta única e prazerosa. O projeto de extensão foi criado em agosto de 2018 com o objetivo de tematizar as atividades oriundas do circo, atuando com a disciplina de Acrobacia e Malabares e com o grupo de pesquisa Educação Física Escolar, Esporte e Lazer do Instituto de Educação Física.
A Prax-Circense também busca a especialização em oficinas de palhaço para a realização de trabalhos nas alas infantis em hospitais, levando entretenimento para crianças internadas.Um dos materiais que serão utilizados na realização das propostas do projeto é o trampolim, que foi recebido pela Prax-Circense por meio de uma doação. Além disso, os idealizadores estão no processo de levantamento de referências para a formulação de um grupo de residência multiprofissional em saúde a fim de estabelecer exercícios circenses para portadores da doença de Parkinson, previamente tramitando entre o Conselho de Ética para sua concretização.
O Parkinson é uma doença degenerativa que afeta principalmente a coordenação motora, e a realização de exercícios físicos lúdicos atua em todas as fases da doença, melhorando equilíbrio e força muscular. O uso da estética circense, portanto, serve para estimular o paciente em sua inserção social de modo mais instantâneo. “É algo novo para as metodologias de ensino brasileiras do ramo: Portugal é o único país que desenvolveu prática semelhante”, explica a professora Elizandra Garcia da Silva, docente da UFF e do Programa de Pós-Graduação em Educação (PPGE).
“A ideia do Prax Circense foi simples e deu muito certo. Ano passado conseguimos reunir um grupo de 75 alunos, e foi ótimo, já que reunimos aqueles que não fazem outras práticas dentro da instituição e que posteriormente se encontraram nas atividades”, afirma . A familiaridade com o tema foi um dos fatores que incentivou a professora a se aprofundar na área. “Sou de família circense, desde criança brincava de circo. Na faculdade, tive pouca coisa de ginástica circense e atualmente tenho o objetivo de centrar pesquisas para nutrir informações do projeto”.
Oferecida nas segundas e quartas, das 15:30 às 16:30 no ginásio da universidade, a Prax-Circense atualmente conta com a participação de seis professores da UFF e mais de 50 alunos que realizam atividades junto a materiais de malabares, tatame, pernas de pau, tecido indiano e lira — sendo as duas últimas oferecidas especialmente às terças e sextas. É de escolha do discente participar todos os dias ou em apenas um. Mesmo com divulgação limitada à página do Facebook, o projeto conquistou um considerável número de participantes.
Ainda com o projeto conseguindo atender os alunos com materiais específicos, a demanda é grande. “Precisamos consertar o trampolim que ganhamos, porque ele é essencial para melhorarmos os saltos realizados nas atividades, que, aliás, são de grau de dificuldade altíssimo”, sustenta Elizandra. De acordo com análises feitas no espaço de realização das práticas oferecidas, o ginásio apresenta estrutura que comporta a fixação de instrumentos como trapézio e lira didática. Nesse caso, é necessária a avaliação de um engenheiro civil para assegurar a estabilidade do local. “Instituições que fazem esse tipo de formação, como a Escola Nacional de Circo e a Fundição Progresso, têm essas ferramentas. O ginásio que utilizamos as comportam, mas é imprescindível um estudo mais apurado para legitimar nossa segurança”, constata.
Em 2019, ocorreu uma parceria entre a Faculdade de Educação Física da UFF e a Faculdade de Educação da Universidade Federal do Rio de Janeiro, que culminou na participação de professores da UFRJ em oficinas ministradas aos alunos. A participação de graduandos em licenciatura, portanto, é essencial para a visibilidade do projeto, visto que estes podem levar o conhecimento adquirido a ser praticado em escolas no estado do Rio de Janeiro.
“O aluno possui um papel importante e dinâmico para a fluidez do projeto. As aulas são fornecidas independente do avanço curricular dos participantes em suas respectivas graduações, e aqueles que participam há mais tempo auxiliam no ensino dos iniciantes”, explica Elizandra. No mês de setembro do ano passado, em função da campanha brasileira de prevenção ao suicídio, foi preparada uma roda de debate para que os alunos pudessem compartilhar experiências e estimular um diálogo honesto e construtivo sobre o tema, que, na opinião de Elizandra, fortifica o trabalho que vem sendo construído. “Não é só um projeto de extensão, é também um grupo de amigos. O aprendizado mais positivo que recebemos retorno foi o acolhimento proporcionado aos alunos e a perspectiva de que demos outra visão sobre os espaços que eles ocupam. Esse foi o principal ganho”, conclui.