“O sedentarismo é um problema grave na sociedade que tem se intensificado com o passar do tempo”. A declaração é do professor do Instituto de Educação Física da Universidade Federal Fluminense (UFF) Jonas Lírio Gurgel, que afirma existir uma tendência geral de culpar o indivíduo por não praticar nenhuma atividade física, quando essa é também uma questão de saúde pública. Entre idosos, principalmente, a falta de exercícios tem um impacto ainda maior na saúde e no processo de envelhecimento, mas a atividade física precisa ser orientada por professores de educação física e pensada a partir das limitações desse grupo, como explica o docente.
Alinhado com essa perspectiva, o projeto PrevQuedas, do Departamento de Educação Física e Desportos da UFF, tem como foco o estímulo à prática de atividades físicas e na prevenção de quedas. Iniciado há 22 anos pelo professor Edmundo de Drummond Alves Junior, hoje aposentado, o programa não se propõe a ser um espaço de atividades físicas apenas para idosos, apesar de ter um público majoritariamente de pessoas na terceira idade. “Uma das propostas é exatamente a questão da intergeracionalidade; então, apesar de ter em sua maioria pessoas idosas, também possui indivíduos mais jovens e isso faz parte de uma crítica antiga sobre programas exclusivos para idosos, que, na verdade, separam essas pessoas do convívio com outras de faixas etárias diferentes”, comenta Jonas.
Semanalmente, às segundas e sextas-ferias, com turmas no período da manhã e da tarde, são oferecidas diferentes atividades que incluem treinamento de força, caminhada e hidroginástica. Segundo o professor, todas as oficinas são voltadas para a questão das quedas, discutindo não apenas como evitar, mas também como cair sem se machucar gravemente e como se levantar: “Em primeiro lugar, a gente trabalha promovendo a saúde; em segundo, evitando as quedas e, em terceiro, ensinando como os indivíduos devem lidar com a situação quando caem”. Além de ensinar os idosos a como se erguer de maneira segura, o programa também discute como cuidar das casas para evitar ou minimizar os impactos desses acidentes.
Pessoas de diferentes idades praticando atividade física na orla do campus Gragoatá da Universidade Federal Fluminense (UFF) / Créditos: PrevQuedas
Há uma relação que pode não ser óbvia entre a frequência das quedas dos idosos e a ausência de atividades físicas. Boa parte do que se atribui ao envelhecimento, na verdade, é um efeito combinado desse processo natural e da redução do nível de exercícios, o que reforça ainda mais a importância do programa PrevQuedas. Quando sedentário, o indivíduo passa a ter perda de potência muscular. “O nosso corpo tem certa inteligência para manter uma determinada quantidade de massa muscular e de massa óssea de acordo com os estímulos aos quais ele é submetido, mas quando ele fica inativo e pratica menos atividade física, há uma tendência à perda de potência muscular”, analisa Jonas. “O corpo se remodela de acordo com esses estímulos e isso faz com que a atividade física seja muito importante para manter um certo grau de autonomia nos indivíduos, principalmente entre os mais velhos”, conclui.
Enquanto as pessoas da terceira idade buscam pelo projeto para se exercitar e evitar acidentes, os mais jovens geralmente participam do PrevQuedas com a intenção de melhorar a saúde. São pessoas na faixa entre os 40 e 50 anos que buscam uma melhor qualidade de vida. Muitas vezes, essas pessoas vêm para acompanhar os familiares idosos e acabam participando do projeto em vez de ficar apenas aguardando pelo parente. O professor destaca que essa situação “é interessante do ponto de vista da socialização e da integração, porque faz com que esse idoso entenda um pouco mais como são os mais jovens, e os mais jovens entendam como interagir com os mais velhos; quais são as dificuldades, por exemplo, do indivíduo mais velho”.
Pessoas praticando atividade física em uma piscina / Créditos: PrevQuedas
Atualmente, o projeto atende cerca de 400 pessoas, acompanhada de uma extensa lista de espera. “A gente nunca consegue dar conta da demanda; tem sempre uma lista de espera muito grande, principalmente por hidroginástica, porque não tem tanta piscina pública oferecendo essa atividade”. A principal forma de ingresso é contatando o projeto; depois, as vagas nas oficinas são preenchidas por meio de um sorteio. Além disso, o PrevQuedas trabalha com uma rotatividade anual, oferecendo os serviços e criando autonomia no indivíduo. “Se no ano seguinte essa pessoa não for sorteada para continuar, ela vai ter um mínimo de autonomia para ter uma vida mais ativa e praticar atividade física”, comenta o professor do Instituto de Educação Física.
Pessoas de diferentes idades em uma sala espelhada / Créditos: PrevQuedas
A longo prazo, o objetivo é criar um observatório do envelhecimento para discutir parâmetros e protocolos de avaliação desse processo no Brasil, algo que já existe em Portugal, conta o professor, e que está tentando criar também no Rio de Janeiro com o auxílio de outros pesquisadores do assunto. “Uma das propostas desse observatório é mapear os grupos de pesquisas que discutem a questão do processo de envelhecimento nas mais diferentes áreas, ou seja, é uma proposta interdisciplinar, multiprofissional e multicêntrica, porque a ideia é pegar as instituições de ensino e pesquisa do estado do Rio de Janeiro e unir esses esforços”. Além de mapear as pesquisas, a intenção é criar um banco de dados com os estudos produzidos sobre o tema, avaliando métodos de pesquisa, de análise e de resultados no estado.
O professor ainda complementa: “Boa parte dos parâmetros que temos hoje são internacionais e o problema disso é que o nosso idoso tem certas particularidades e diferenças próprias da cultura do nosso país, que não são consideradas. É ideal que a gente tenha os nossos parâmetros de avaliação e os nossos protocolos validados, mas isso é algo que exige esforço e a participação de toda comunidade acadêmica que trabalha com o tema”. A proposta do observatório, sobretudo, é reunir informação suficiente para propor políticas públicas municipais e estaduais que considerem as diferenças culturais do Brasil quanto ao tema da velhice, que vão desde questões socioeconômicas a como a sociedade enxerga as pessoas na terceira idade, muitas vezes de uma forma discriminatória, argumentando que os idosos são frágeis e incapazes, conclui.
Para saber mais sobre o projeto PrevQuedas, é possível acessar o site do programa: https://prevquedas.uff.br/ e o perfil no Facebook: https://www.facebook.com/profile.php?id=100064679213019. Há também um podcast com informações sobre atividades físicas e como evitar quedas produzido durante o período de pandemia de Covid-19 e que retornou ao ar neste ano: https://open.spotify.com/show/1G7crcfrMEBkYD7gx6io6m.
Edmundo de Drummond Alves Junior é professor Titular da Universidade Federal Fluminense (UFF), é graduado em Educação Física pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), mestre em Educação Física pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e doutor em Educação Física pela Universidade Gama Filho (UGF). Tem experiência na área de Educação Física, com ênfase em atividade física e envelhecimento, atuando principalmente nos seguintes temas: envelhecimento e sociedade, acidentes por quedas, estudos do lazer e promoção da saúde. Faz parte do quadro de professores permanentes do programa de Mestrado Acadêmico em Ciências do Cuidado em Saúde, oferecido na Escola de Enfermagem da UFF, e coordena dois grupos de pesquisa: Envelhecimento e Atividade Física (GPEAF) e Esporte Lazer e Natureza (GPELN).
Jonas Lírio Gurgel é graduado em Educação Física pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ), cursou mestrado em Engenharia Biomédica e doutorado em Gerontologia Biomédica pela Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUC-RS). Realizou pós-doutorado em Fisiologia do Exercício na Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UFRJ). É assessor de pesquisa da Universidade Federal Fluminense, docente e coordenador da área da Educação Física da Residência Multiprofissional em Saúde do Hospital Universitário Antônio Pedro. É também sub-chefe do Departamento de Educação Física e Desportos da Universidade Federal Fluminense (UFF), docente permanente do Programa de Pós-Graduação Stricto Sensu em Ciências do Cuidado da Saúde da Escola de Enfermagem e do Programa de Pós-Graduação Stricto Sensu em Ciências Cardiovasculares da instituição.