Pesquisadoras da UFF destacam o papel da mulher no universo acadêmico

Foto: “O grito da Guerreira”, de autoria de Andreza Azevedo Cunha, discente de graduação em Sociologia.

O dia 8 de março é um marco internacional na luta das mulheres por igualdade de direitos. Em 1911, uma tragédia motivou a criação da data - a morte de mais de cem operárias em um incêndio de uma fábrica têxtil nos Estados Unidos. Hoje, 107 anos depois, ainda são constantes as batalhas enfrentadas para que o público feminino conquiste mais espaço e respeito na sociedade.

Com o objetivo de levantar a reflexão acerca da importância da participação feminina no ambiente acadêmico, a UFF homenageará, na próxima quinta-feira, 50 mulheres, entre professoras, servidoras e terceirizadas, que fazem a diferença para o ensino e a pesquisa na universidade. O evento “Mulher - Presente e Futuro” é organizado pela Pró-Reitoria de Pesquisa, Pós-Graduação e Inovação (Proppi) e será realizado no Auditório do NAB (Campus da Praia Vermelha), às 9h30.

Segundo a coordenadora de pós-graduação da Proppi e professora do Instituto de Física, Andrea Latgé, o evento é uma homenagem​ especial comemorativa do Dia ​Internacional​ das Mulheres, que destaca o papel feminino no universo acadêmico e alerta para a importância de se fomentar mais ativamente sua inserção em várias áreas do conhecimento. O número de mulheres ​docentes e discentes, nos diferentes setores da UFF,​ é cada vez maior, com algumas pequenas exceções como nas áreas de Física e de Ciências da Computação. No Programa de Pós-Graduação em Física, por exemplo, a proporção de mulheres é de 10,2%, no Instituto de Física, de 17,5%, na Matemática elas representam 38,4%, enquanto no Instituto de Química este número cresce para 45%.

Pensando em como incentivar jovens estudantes a se interessarem por essas áreas, predominantemente masculinas, alunas e professoras dos cursos de Engenharia e Tecnologia da Informação (TI) da UFF criaram grupos que fomentam a participação feminina na ciência e tecnologia, como o Include Meninas e o Woman in Engineering.

Acho de grande importância, como mulher e pesquisadora, ajudar a diminuir a sensação de não pertencimento que muitas meninas sentem”, Karin Calaza.

Andrea explica ainda que, em geral, a participação feminina em diferentes setores da instituição é crescente, mas isso não é observado nas posições de liderança. Nas universidades federais brasileiras, por exemplo, apenas 19 mulheres ocupam o cargo máximo de reitor num universo de 63 posições, representando 28,3% de participação. “Este é o chamado efeito “tesoura”, que é tema de vários trabalhos no contexto da participação feminina no ambiente acadêmico e científico. Estudos da distribuição de bolsas de pesquisa das agências de fomento revelam claramente essa realidade. Enquanto nas bolsas de iniciação científica, 59% são para mulheres, na distribuição de bolsas de produtividade científica com maior financiamento este número é 35,5%. Maior contraste ainda se observa no grupo das bolsas de mais recursos (1A), onde o percentual cai para 24,6%”, detalha.

Uma das dificuldades globais que mulheres cientistas sempre enfrentaram é conciliar a maternidade com as atividades de pesquisa. O CNPq reconheceu este entrave e em 2013 adotou uma política que deu o direito a um ano adicional de bolsa de produtividade quando as pesquisadoras tiverem filhos. “Com a medida, o CNPq  atendeu uma demanda das pesquisadoras e de grupos envolvidos no aumento da participação das mulheres nas ciências. Uma medida similar já havia sido implantada com sucesso para bolsistas de mestrado, doutorado e pós-doutorado”, relembra Latgé.

A pesquisadora ainda acrescenta que é essencial garantir direitos de creche e escolas de tempo integral na sociedade, que permitam um envolvimento maior nas atividades acadêmicas de ambos os sexos. “Além disso, é preciso que haja uma aproximação com as escolas de ensino médio para a divulgação das pesquisas desenvolvidas pelas docentes universitárias. A representatividade é fundamental e esse tipo de iniciativa encontra eco e identificação das alunas com as pesquisadoras”, esclarece.

Na opinião da professora do Instituto de Química e homenageada, Maria Vargas, no nosso  modelo arcaico de academia, ainda se acredita no mito de que a profissão de cientista demanda dedicação absoluta em detrimento de si mesma e da família. Com isso, muitas mulheres talentosas desistem de continuar na carreira e encontram-se cada vez mais pesquisadoras que optaram por não terem filhos. “Vale destacar também que somente 14% dos membros da Academia Brasileira de Ciências são mulheres. Somos pouco representadas entre os revisores e editores de revistas científicas, entre palestrantes em congressos científicos - o que resulta em menor visibilidade da nossa pesquisa, nos comitês de avaliação dos órgãos de fomento, nas posições de comando nas universidades e instituições de pesquisa”, afirma.

A professora de Economia, especialista na área de estudos de gênero e uma das homenageadas do evento, Hildete Pereira de Melo, é uma das vozes mais atuantes em defesa da igualdade de gênero e foi uma das primeiras docentes da universidade a trabalhar os temas feministas, na década de 70, quando essa questão ainda era considerada irrelevante no meio científico. “Na área acadêmica nacional, somente quando as pesquisadoras norte-americanas, inglesas e francesas conquistaram o respeito das suas academias, nossos colegas passaram a ter um olhar diferente para esse campo teórico, o que levou anos para acontecer. Levantaram comigo há quase 50 anos a bandeira dos estudos sobre as mulheres e depois das relações de gênero na UFF, as professoras Raquel Soihet, Suely Gomes Costa, Ismenia de Lima e Cenira Braga, cuja cumplicidade e destemor quero lembrar aqui”, ressalta.

Para ela, ainda hoje, em 2018, vivemos momentos de embate, com destaque ao protagonismo que o ativismo das mulheres negras assumiu nas lutas em todo o Brasil. Segundo Hildete, para as brasileiras, faltam ainda muitas conquistas fundamentais, como a descriminalização do aborto, o fim da violência doméstica, a equidade salarial, entre os sexos, a divisão igualitária dos afazeres domésticos e cuidados com crianças, idosos e doentes. “Além disso, é fundamental uma maior participação das mulheres nos cargos de poder em todo o país. São tantos os sonhos!”, idealiza.

A neurocientista e integrante do projeto “A voz feminina da pesquisa”, Karin Calaza, concorda plenamente com a importância de mais mulheres ocuparem cargos elevados no Brasil. “Se ampliarmos essa discussão para cor da pele, a situação é terrivelmente lamentável”, acrescenta.

Segundo ela, há muitas conquistas já realizadas e não se pode negar que a condição da mulher evoluiu bastante recentemente, afinal, em 1833, a primeira estudante foi aceita para cursar uma faculdade nos EUA e, em 1882, na Alemanha, a educação superior ainda era negada ao público feminino. “Existem diversas histórias de mulheres cientistas cujos trabalhos foram creditados apenas aos homens que pesquisaram em conjunto com elas, como Esther Lederberg ou Rosalind Franklin. Hoje no Brasil já somos metade do quadro docente universitário, é um avanço incrível. No entanto, ainda temos que publicar mais do que os homens para conseguir os mesmos títulos, prêmios, honrarias, ainda somos subrepresentadas em áreas como as ciências duras. Ainda temos muito a avançar”, observa Karin.

A pesquisadora ressalta que não existem diferenças cognitivas entre homens e mulheres que possam justificar os contrastes nos espaços ocupados por ambos. “Como neurocientista, acredito que a capacidade cognitiva não tem nenhuma relação com gênero e cor de pele. Porém, a biologia mostra que a diversidade é muito eficiente no processo da evolução. Certamente, quanto maior a variedade de pessoas com suas diferentes habilidades, formações, paixões e histórias, melhor será a evolução de um trabalho de pesquisa frente à maior variedade de perspectivas e potencial criativo. Então, é óbvia a importância feminina em grupos de pesquisa de qualquer área”, explica.

Nesse sentido, a neurocientista levanta outro tópico relevante dentro dos estudos de gênero, relacionado à questão da perpetuação dos estereótipos associados ao sexo feminino. Segundo Karin, “os estereótipos afetam negativamente tanto a performance de um indivíduo, como, por exemplo, quando se diz que "matemática não é coisa de mulher", quanto à avaliação que fazemos do outro, conhecida como viés implícito. Esse prejuízo acontece de maneira inconsciente, já que grande parte do processamento cerebral ocorre sem que a pessoa se dê conta. Dessa maneira, a cultura a qual estamos expostos desde que nascemos reforça e gera a ameaça pelo estereótipo e o viés implícito, prejudicando as mulheres na academia”, esclarece.

Para ela, é um orgulho e uma alegria sem tamanho participar do atual período em que a universidade vem se tornando mais inclusiva. “É incrível ser um “modelo” de mulher que faz o que ama e conquistou um espaço nesse mundo que já foi só masculino. Tanto na graduação quanto na pós-graduação, acho de grande importância, como mulher e pesquisadora, ajudar a diminuir a sensação de não pertencimento que muitas meninas sentem”, conclui.

 

LISTA DAS HOMENAGEADAS - "MULHER - PRESENTE E FUTURO"

Docentes
1- IDA MARIA SANTOS FERREIRA ALVES   
2- LAURA CAVALCANTI PADILHA  
3- LÍVIA MARIA DE FREITAS REIS TEIXEIRA  
4- LENI JOAQUIM DE MATOS  
5- CELUTA SALES ALVIANO 
6- ELIANE BARRETO BERGTER
7- LUCIA MENDONÇA PREVIATO
8- ANDREA VIDEIRA ASSAF   
9- LÍVIA AZEREDO ALVES ANTUNES   
10- REBECA DE SOUZA AZEVEDO   
11- IZABEL CHRISTINA NUNES DE PALMER PAIXÃO  
12- HELENA CARLA CASTRO CARDOSO DE ALMEIDA   
13- VALÉRIA LANEUVILLE TEIXEIRA    
14- HILDETE PEREIRA DE MELO HERMES DE ARAÚJO   
15- SUELY GOMES COSTA      
16- CARMEM APARECIDA DO VALLE COSTA FEIJÓ    
17- ANA URRACA RUIZ   
18- MARIA CECÍLIA BASTOS VIEIRA DE SOUZA    
19- MARIA DAS GRAÇAS FIALHO VAZ    
20- MARIA DOMINGUES VARGAS   
21- ANDREA BRITO LATGÉ   
22- ANA MARIA MOTTA RIBEIRO   
23- LETÍCIA OLIVEIRA  
24- ETEL RODRIGUES PEREIRA GIMBA 
25- KÁTIA GOMES DE LIMA   
26- AURA CONCI  
27- DEBORA CHRISTINA MUCHALUAT SAADE   
28- LUCIA MARIA DE ASSUMPÇÃO DRUMMOND   
29- GESMAR VOLGA HADDAD HERDY   
30- MARIA LUIZA GARCIA ROSA   
31- CHRISTIANNE BRETAS VIEIRA SCARAMELLO
32- ANA MARIA MAUAD DE SOUSA ANDRADE ESSUS   
33- SONIA MARIA TADDEI FERRAZ    
34- CARLA APPOLLINARIO DE CASTRO   
35- CARMEN LUCIA TAVARES FELGUEIRAS    
36- LIGIA MARIA DE SOUZA DABUL   
37- KITA CHAVES DAMASIO MACARIO    
38- LUCIA DA CRUZ DE ALMEIDA    
39- MIRIAN ARAUJO CARLOS CRAPEZ   
40- LUCIA TEIXEIRA DE SIQUEIRA E OLIVEIRA     
41- MARIÂNGELA RIOS DE OLIVEIRA   
42- ANA PAULA MENDES DE MIRANDA    
43- ANA LUIZA SPADANO ALBUQUERQUE    
44- KARIN SOARES GONÇALVES CUNHA  
45- ELIANE PEDRA DIAS  

Técnicas administrativas
46- CLARICE MARIA SIQUEIRA BRAZÃO
47- APARECIDA GOUVEA
48- ANÍCIA TEIXEIRA PIRES DA SILVA
49- VERA LUCIA LAVRADO CUPELLO CAJAZEIRAS
50- MARIA DE LOURDES PEÇANHA

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